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PASSE LIVRE E A CONTRADIÇÃO ABERTA

Ousarme Citoaian | ousarmecitoaian@yahoo.com.br
1SimancaOs tipos mais conservadores, que querem tratar os movimentos sociais na pancada, uniram-se aos progressistas, em apoio ao Movimento Passe Livre (MPL), escancarando uma contradição. Coerente mesmo foram as PMs da Bahia e de São Paulo, fazendo o que é da sua tradição fazer: baixar o pau (v. charge de Simanca). Cientistas sociais e palpiteiros em geral estão incertos quanto ao que pretende a massa: vagamente, menos corrupção, mais educação (quase criei uma “palavra de ordem”), mais saúde pública, menos futebol, mais seriedade com o dinheiro público, menos safadeza…  No atacado, todos aprovamos esta pauta, mas falta a ela o varejo, o foco concreto e claro.

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Movimento (ainda) simpático à direita
Tem sido uma festa protestar contra tais coisas (e ainda a sogra chata, o vizinho ranzinza e o preço do tomate), mas não me divirto tanto. Entendo ser este um movimento de esquerda (se me permitem usar a velha classificação francesa, para mim ainda válida). E a direita não tarda a tratar essa turma como trata índios, sem-terra e semelhantes, todos incluídos na vasta lista de “baderneiros”. Por menos disso ela já derrubou um presidente e pôs o Brasil em “ordem unida” durante 21 anos, enquanto arrancava as unhas dos descontentes. Freado o aumento das tarifas, o MPL, ao voltar às ruas (espero que volte), deverá focar-se em um dos muitos problemas nacionais.
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“DOR DE AMOR DÓI MAIS DO QUE BURSITE”

3Dor de amorO verbo amar transitivo indireto (com a preposição “a”) foi, em tempo que longe vai, exclusivo jargão religioso. “Amar a Deus sobre todas as coisas”, está grafado na tábua. A gramática quer, em relação a coisas e pessoas, o verbo não preposicionado. Amar era também de uso menos extenso: homens amavam mulheres, mulheres amavam homens, homens e mulheres amavam suas mães, estas os amavam sem medidas… Os para-choques repetiam uma frase produzida por alguém de coração dilacerado (ou vítima de crônica subliteratura): “Amor só de mãe!” – ai que me embriago de tanta poesia! Compreende-se. Quem leu Rubem Braga sabe que “dor de amor dói mais do que bursite”.
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Velha calça desbotada ou coisa assim
Voltando ao amar transitivo direto, diga-se que ele foi “democratizado”. Amavam-se pessoas, hoje se ama praia, macarrão com queijo, sorvete de coco, carro novo, a velha calça desbotada e, de moto, ama-se o vento na cara. São modismos que o tempo nos traz: conheço uma jovem senhora que ama seu iPhone de recentíssima geração (será isto o chamado sexo virtual que nunca entendi?). A boa linguagem, pela qual poucos na mídia ainda se interessam, recomenda que se goste das coisas citadas acima, sendo vedado amá-las. Se, por acaso, alguém não sabe a diferença entre gostar e amar, que tente beijar uma máquina. Adianto-lhes que não funciona, a não ser que seja uma… “máquina”.
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5Batata fritaAdoração ao arroxa e à batata frita
Cartola, em licença poética escreveu: “Não quero mais amar a ninguém…”, e caiu em “erro”, por usar a forma “religiosa” (“Não quero mais amar ninguém”, diz a norma). E quase tudo que foi dito vale para o verbo adorar, que igualmente nos remete à igreja. Adorar só a Deus e signos sagrados, era assim que era. Depois, o povo, que não está nem aí para gramáticas e gramáticos, mudou a regra. Hoje, com todo respeito, adora-se batata frita, novela de tevê, show de arrocha e de dupla “caipira”. Pelo sentido “clássico” do termo, tem-se a ideia de que o maluco se ajoelha diante do pacote de fritas e também genuflectido assiste à novela das nove. Medonhos tempos, estes.

QUEM DERA QUE ESSA RUA FOSSE MINHA!…

As ruas nos falam de dados momentos, lembranças que ficaram. “Se essa rua fosse minha/ eu mandava ladrilhar/ com pedrinhas de brilhante/ só pra ver meu bem passar”, diz o antigo frevo Vassourinhas. Antônio Maria (“o bom Maria”, como o chamava Vinícius, seu colega de quarto), morando no Rio e, ferido de saudades da terrinha, abre seu Frevo nº 3 dizendo: “Sou do Recife, com orgulho e com saudade”, para depois introduzir “Rua antiga da Harmonia,/ da Saudade, da Amizade e da União…/ São lembranças noite e dia”. Em poucos versos, quatro ruas de nomes sonoros, que mexem com os sentimentos da gente: harmonia, saudade, amizade, união.
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7AlceuMachado de Assis fala das ruas do Rio

Meu endereço em Buerarema era Manuel Vitorino, 6 (esquina com Siqueira Campos) – mania que as pessoas têm por vultos estranhos à cidade. Isso mudou um pouco. Já temos na antiga Macuco as ruas Paulo Portela, Manuel Lins, Pastor Freitas – personagens locais e já mortos, comme il faut. Mas eu queria falar era do fascínio que os nomes de ruas exercem sobre mim e, pelo que vejo, em vários autores. Lembro aqui de três deles, tocando o tema: Machado de Assis, Antônio Maria e Alceu Valença. Nos contos de Machado é possível saber muito do velho Rio, pelas ruas que o mestre cita: Larga de S. Joaquim, da Alfândega, do Lavradio, da Quitanda e, naturalmente, do Ouvidor.

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Um amor que sumiu nas ruas do Recife

“Sob uma chuvinha miúda, triste e cortante, como no enterro de Brás Cubas, o menino passeia sua melancolia por estas ruas que, transeuntes apressados sequer suspeitam, lhe pertenceram um dia. E chora as mudanças: mudou a cidade, mudaram os tempos, mudou ele, que ficou depressivo e meio adulto, morreu de velha a caramboleira, silenciaram os sabiás e bem-te-vis da infância que se foi” (Antônio Lopes: Luz sobre a memória – Agora Editoria Gráfica/1999). Perdidão da Silva, Alceu Valença parece procurar seu amor sumido nas ruas do Sol, da Aurora, da Matriz, das Ninfas, da Boa Viagem, da Soledade – mas como sempre acontece em casos semelhantes, o esforço é vão.

(O.C.)

4 respostas

  1. Zelão diz: – “Perder os anéis para salvar os dedos!”
    “Por que deve caber ao povo apresentar uma pauta reivindicatória consistente? O recado está sendo dado aos governantes, políticos de forma geral, entidades civis organizadas, judiciário e cientistas sociais.”
    As manifestações dizem bem claras e estão sendo gritadas em alto tom das “INSATISFAÇÕES DO POVO.” O povo sabe o que está errado porque ele é o prejudicado. E, ao contrário do que dizem os atônitos políticos das “esquerdas festivas,” não quer promover um “GOLPE” nas instituições: – Quer a reformulação delas através da aplicação da Constituição Federal e das Leis Ordinárias.
    Aos que apregoam entre atônitos e temerosos de perderem o “status quo” de que o povo está perdido e extrapolando os seus direitos democráticos, por ter iniciado o movimento revindicando o não aumento de 0,20 centavos nas passagens do transporte público e ter ampliado a pauta para outras revindicações – que a princípio parecem desconexas – é bom lembrarem que a Revolução Francesa teve início com o povo protestando pela falta de pão e acabou por derrubar a realeza e decapitar na guilhotina, milhares de “nobres cabeças.”
    No Brasil o povo está dando recado nas ruas. Se os “nobres senhores” não souberem ou quiserem entender, que é melhor “perderem os anéis e salvarem os dedos,” pode acabar perdendo mais do que isso.

  2. Professor (O.C.), a charge do Simanca é um poema, concordo. Só não, e estou cético, é do propósito nacional-pátrio desse movimento MPL, que de uma hora para outra, todas os dias, toma conta das ruas das nossas cidades com o aparato e cobertura tendenciosa da mídia, rica , capitalista e burguesa, que não suporta os governos implantados,democraticamente de 2002 para cá. Até ‘dono’ de partido de direita vai à televisão incentivar os manifestantes a manter as passeatas, quanto a isso, e aquilo outro. Negando e fazendo pouco dos avanços sociais e econômicos que o Brasil alcançou em igual tempo. Resumindo: Há corrupção,sim! E a saúde? altos investimentos, urgentes e permanentes, sim!…Educação: Idem… e isso e aquilo outo? …Também!… E dar para fazer tudo em 10 anos, em detrimentos das décadas dos outros governos, Não!

  3. Sr Ousarme,
    Não é bem assim “cientistas sociais estão incertos quanto ao que pretende a massa”. Sou Cientista social e nossa classe sabe bem o que pretende a sociedade. As demandas são apenas os stopins. Só quem não quer enxergar não percebe que a questão se baseia quase que estritamente na forma como se pratica política no Brasil, então,sendo assim, o foco meu caro, é a reforma política. Observe atentamente isto.

  4. Sintomatologia: Texto permeado de Demonização da polícia e blindagem dos vândalos. ( Mistura vândalos com manisfestantes como se a intencionalidade e motivações fosem as mesmas)
    Diagnóstico do texto:
    Estratégia e efeito do evangelho maxista nas entrelinhas do texto. tdc tsc.

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