Tempo de leitura: 4 minutos

paixaobarbosaPaixão Barbosa

Detentora de uma significativa marca – mais de 20 milhões de votos nas eleições presidenciais de 2010 – e ostentando índices também significativos nas últimas pesquisas de opinião na corrida para 2014, a ex-senadora Marina Silva surpreendeu a quase todo o mundo político ao optar pelo ingresso no PSB, depois de ver naufragar nos meandros legais do TSE a sua Rede Sustentabilidade, que ainda pretende ser um partido político sem os desgastes e as marcas negativas que as legendas atuais carregam consigo. A surpresa, contudo, foi mais pela opção de entrar num partido que já tem um pré-candidato definido, o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, do que pelo fato de não aceitar os conselhos recebidos de se manter à margem da disputa de 2014, preservando, assim, a imagem de pureza com que ela fez questão de dourar a ideia da sua Rede.

Afinal, por maior que seja o desejo de apresentar-se para a disputa com uma proposta de partido bastante diferenciada dos demais, não seria possível imaginar que Marina Silva atendesse à banda dos seus seguidores que preferiam vê-la fora da campanha a decidir reingressar no sistema eleitoral num partido tradicional e, portanto, capaz de carregar no seu DNA as mazelas que tanto têm desgastado as legendas tradicionais. Até porque Marina, embora faça questão de manter um discurso diferenciado, lembrando sempre que sua luta não tem os mesmos estímulos dos políticos considerados tradicionais e sim são gerados pela vontade de transformar profundamente as bases sociais do Brasil, correria um risco muito grande de perder visibilidade ao ficar sem palanque por mais quatro anos, especialmente num País no qual os eleitores têm memória de peixe, ou seja, quase nenhuma.

Assim, para analistas políticas e também para as chamadas “cobras criadas” da cena política nacional, a ex-senadora seria obrigada a participar, de algum modo, das eleições do próximo ano e, com a frustração provocada pela decisão do TSE, o único caminho seria mesmo ingressar numa legenda já formada. Tanto que foram várias as legendas que se ofereceram para abrigá-la e aos “marineiros”, como são chamados seus seguidos mais fiéis. Todas de olho no patrimônio eleitoral que Marina conquistou em 2010 e que as pesquisas de opinião recentes revelam que ela está mantendo.

Inesperada mesmo foi a decisão de ingresso no PSB. Nem tanto pela imagem da sigla, uma vez que a legenda socialista tem sido vista no Brasil como uma espécie de segundo time de muita gente, ou seja, mesmo os que não votam em seus candidatos manifestam simpatia pelo partido criado em 1947 e que teve no baiano João Mangabeira um dos seus fundadores e principais ideólogos. Extinto em 27 de outubro de 1965, pelo Ato Institucional nº 2, promulgado pelo governo ditatorial, o partido foi recriado oficialmente em 1988, mas nunca ocupou um espaço tão significativo na cena política nacional que lhe pudesse atrair desafetos. O que, ao lado de não ter tido nenhum figurão dos seus quadros envolvidos nos recentes escândalos de corrupção, contribuiu para ter a imagem simpática já citada.

Ao entrar no PSB, Marina aumentou as preocupações do PT e de Dilma Rousseff, além de deixar Aécio Neves e o seu PSDB também de cenho franzido, como sempre acontece quando um fato novo acontece no cenário político e, além de se constituir uma surpresa, carrega potencial de provocar alterações num quadro até então estável e no qual vinham se baseando as análises para 2014. Mas, além da surpresa e do incômodo gerados, o gesto da ex-senadora deixou no ar uma grande interrogação a respeito do que realmente Marina deseja para seu futuro imediato, ou seja, em relação às eleições de 2014.

Por uma simples questão de bom senso, não que isto seja o principal numa análise política, é previsível supor ser muito difícil que uma pré-candidata que aparece nas pesquisas de opinião acima da casa dos 20% – na última, do Ibope/Estadão, recebeu 22% das indicações, mas já esteve com 26% – vá abrir mão de uma postulação à Presidência da República para um pré-candidato que tem patinado entre 4% e 5% nas mesmas pesquisas. Até porque a lógica e a tradição nessas disputas é que o partido lance o nome que melhor estiver pontuando, não aquele que é dono da legenda, mesmo sendo ele um anfitrião simpático como tem sido o Eduardo Campos.

Claro que o discurso da ex-senadora e dos seus escudeiros terá que ser mesmo o da humildade e do despojamento, até porque eles estão entrando numa legenda que já tem candidato declarado e em plena campanha. Mas, cá com os meus botões, eu prefiro acreditar na hipótese de que Marina Silva continua, sim, com a pretensão única de sentar na principal cadeira do Palácio do Planalto. De que lhe serviria, a uma altura destas da vida, ser candidata a vice-presidente, quando se sabe a pouca importância que tal cargo ocupa nas dobras do poder no Brasil? Aos 55 anos de idade e com uma saúde frágil – resultado da labuta inclemente nos seringais amazônicos – ela tem que pesar suas oportunidades e levar em conta o fator tempo.

Assim, deixando claro que sempre posso estar muito enganado, acredito que o propósito da comandante do Rede Sustentabilidade é fazer com que a realidade política se imponha aos sonhos de Eduardo Campos. A aposta deve ser a de que ela se mantenha num patamar elevado nas indicações das pesquisas de opinião e que, dentro de alguns meses, o pernambucano se renda ao fato de que não cabe na lógica da política um partido abrir mão de um nome potencialmente tão poderoso para disputar a Presidência da República e, postergue sua postulação para 2018, deixando para Marina Silva a bola da vez em 2014. Até porque, para Campos, o tempo pode até lhe ser favorável.

E, aí, mesmo que docemente constrangida, a acreana aceitará a missão de disputar nova eleição presidencial, rompendo de vez a bipolaridade entre PT e PSDB, que marcou os pleitos presidenciais desde 1994 no Brasil. Muita água ainda irá passar debaixo das pontes deste Brasil antes de uma definição, então será preciso esperar para ver onde este rio nos levará.

Paixão Barbosa é jornalista e ex-diretor da Agência A Tarde.

Artigo publicado originalmente no Blog do Gusmão

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