Tempo de leitura: 3 minutosFelipe de Paula | felipedepaula81@gmail.com
A crença em figuras brilhantes, geniais, reforçada na instituição universitária já entre os calouros, colabora apenas para o desenvolvimento de quadros de depressão, sentimento de inferioridade e aumento dos índices de evasão. Professores formados na lógica “estrelar” atuam de forma antipedagógica, anticriativa e quase proibindo a autonomia estudantil.
Sou um acadêmico. Entrei numa universidade pela primeira vez no ano 2000. Às vésperas de completar 19 anos, fiz minha matrícula como estudante de graduação. Nunca mais saí da universidade. Agora, aos 35 anos, sou docente há sete. Fui estudante de graduação, de pós-graduação, servidor técnico-administrativo e professor. Atuei em universidade particular, estadual e em duas federais. Tenho meus méritos? Talvez. Mas acima de qualquer coisa, tive privilégios.
Tive a oportunidade, certa feita, de ouvir uma fala de Ricardo Castro, maestro da Neojibá. Ele disse algo como: “Por que virei pianista e meu vizinho não? Porque o piano estava na sala de minha casa”! O “piano” na sala de minha casa foi uma estrutura familiar que me permitiu estudar tranquilamente, as bolsas de estudo que recebi, e uma série de outros privilégios que oportunizaram o livre desenvolvimento de minha intelectualidade.
Aí vem um ponto importante: o livre desenvolvimento da minha intelectualidade não significa que possuo algo especial, alguma distinção. Não sou, em nenhum aspecto, superior a nenhum outro cidadão possuidor de quaisquer níveis de estudo. Possuo saberes diferentes. Não mais importantes, não inferiores. Diferentes apenas.
Isso se aplica a mim na mesma medida que se aplica a qualquer outro estudioso. Minha breve vivência acadêmica permite a constatação de um mal comum neste encantador meio social: a vaidade.
É inegavelmente satisfatório estudar, planejar e redigir um trabalho ou executar uma aula que “funciona”. Você sente que a sua labuta sobre os livros, sua reflexão e a construção do seu discurso funcionaram, atingiram o objetivo e levaram um conhecimento que impactou positivamente a vida e a formação de alguém. Isso é bom, é gratificante. Contudo, eu – assim como qualquer outro acadêmico – sou incapaz de produzir isso sozinho. Minha ação é fruto das leituras, reflexões, aulas que assisti, diálogos que travei, alunos que tive. Sim. O docente é também um aprendiz.
Na universidade, uma sala de aula “clássica”, com fileiras ordenadas e apontadas em direção à “estrela” docente, parece-me arcaica. Uma roda onde todos – discentes e docente – surgem em posição de igualdade parece adequada.
A crença em figuras brilhantes, geniais, reforçada na instituição universitária já entre os calouros, colabora apenas para o desenvolvimento de quadros de depressão, sentimento de inferioridade e aumento dos índices de evasão. Professores formados na lógica “estrelar” atuam de forma antipedagógica, anticriativa e quase proibindo a autonomia estudantil.
Qual o caminho que enxergo para o ambiente acadêmico? Um espaço onde se reduza a “masturbação intelectual”, que gera prazer ao praticante, mas não produz efetivamente nada, um espaço onde sejam evitados textos desconexos, longos e usando de jogos de palavras que possuem mais sonoridade do que conteúdo.
O caminho é uma instituição universitária que seja feita de pessoas que compreendam o valor da criação, da solidariedade, do afeto, da objetividade e, principalmente, da humildade. Muito me anima ver estudantes que começam a desconstruir a lógica da meritocracia, que questionam a lógica de autoridade pautada apenas nas tradições, no cânone, nos protocolos. Que os paradigmas universitários se pautem por uma lógica humana. Esse será o meteoro que dará conta dos dinossauros acadêmicos.
Felipe de Paula é professor universitário.