Fernando, descanse em paz e tenha certeza que a forma como tiraram a sua vida deixou a todos nós profundamente chocados. À família de Fernando a nossa solidariedade pelo sofrimento e esperar que a justiça seja feita. JUSTIÇA!
As pessoas do mundo estão malucas. Quando pensamos que já vimos de tudo, aparece um novo episódio que nos choca profundamente.
Fernando era uma dessas pessoas vagantes que percorre a cidade procurando algo para fazer ou não fazer nada. Era visto caminhando jocosamente com sua camisa jogada no ombro e usando sua bermuda de tactel, às vezes ébrio, ás vezes sóbrio e muitas vezes fazendo pequenos serviços.
Constantemente ele percorria as ruas do Jardim Primavera querendo capinar os matos que nascem nas calçadas e dali tirava seu dinheiro para comprar o que quisesse.
Certa vez ele esteve na casa de Maria de Fátima/Carlos (irmã e cunhado) e pediu a bicicleta para ir a algum lugar e só devolveu no outro dia. A bicicleta é o meio de transporte de Carlos para ir ao trabalho até hoje. Como Fernando sempre fazia serviço de capinagem no quintal, o casal não se importou. Ficaram preocupados pensando em ter perdido a bicicleta, mas no outro dia chegou Fernando trazendo a bicicleta de volta. E assim Fernando ia levando sua vida, do seu jeito, sem se preocupar com estética, com responsabilidade, com trabalho certo. Era a sua maneira de ser com todo direito que a democracia dá ou parece dar.
Tomamos como surpresa a notícia em alguns blogs: “Criminosos ateiam fogo em corpo de homossexual em Itabuna”, “Morre no Hospital de Base homossexual que teve corpo queimado em Itabuna”. Até aí, o homossexual não tinha um nome próprio, não tinha idade, não tinha família, não tinha residência, não tinha nada. Era apenas um homossexual, como se fosse um título de grande relevância. Ora, ser ou não ser homossexual não seria a questão. Estava ali completamente queimado, um cidadão, do sexo masculino (sua particularidade interessava somente e tão somente a ele).
Após a manchete discriminatória aparecem todos os dados de Fernando, dizendo seu nome completo, idade, endereço etc.
Enfim, estamos vivendo no mundo em que os valores éticos, morais, civilizatórios, humanitários estão caindo por terra. Ser amoral, imoral e aético interessa a alguma parcela da sociedade porque sendo assim está tirando proveito de alguma coisa do grupo que assim age. Inversão de valores.
Por motivo torpe, insignificante, por uma bicicleta emprestada e devolvida, um monstro pede uma garrafa pet, vai a um posto compra gasolina (não se pode vender combustível em recipiente não apropriado, não é lei?) e friamente ateia fogo em uma pessoa sem o menor receio. Queimou Fernando, matou Fernando e por que não esperou a chegada da polícia para se entregar? Fugiu do flagrante porque sabe que a impunidade impera neste país chamado Brasil. Enquanto isto, Fernando morreu e a sua família está em sofrimento.
Sinceramente, matar é banal e a vida está cada dia mais fragilizada.
Fernando, descanse em paz e tenha certeza que a forma como tiraram a sua vida deixou a todos nós profundamente chocados. À família de Fernando, a nossa solidariedade pelo sofrimento e esperar que a justiça seja feita. JUSTIÇA!
Walmir do Carmo é artista. Postado originalmente no Ipolítica.