Ederivaldo Benedito || ederivaldo.benedito@gmail.com
Cinco décadas depois – tardiamente, quem sabe – eu registro a morte trágica de um cidadão, um homem que luta em defesa da liberdade. Cinquenta anos, pois, para lembrar a memória de um resistente democrático.
Neste quatro de dezembro de 2018 – coincidentemente, quando o Brasil volta-se para o passado e uma significativa parcela da sociedade assume claramente um posicionamento político que prega a união da família para fortalecer o Estado e este, por sua vez, integrar o país – me vem a lembrança dos cinquenta anos da trágica morte de Wilson Chagas. Um homem simples, do povo, uma célula, um cidadão que, com suas convicções e sua luta em Itabuna, no sul da Bahia, contribuiu para a construção de uma sociedade mais justa, humana, fraterna e igualitária.
Baiano de Belmonte, “Seu Wilson” era filiado ao Partido Comunista Brasileiro e servidor da Prefeitura de Itabuna quando, aos 47 anos, por volta do meio-dia do quatro de dezembro de 1968, foi atropelado na Avenida Juracy Magalhães, próximo a sua residência. Eu era seu vizinho, parede meia de seu Wilson e estava á época com nove anos. Cinco décadas depois, a cena não saiu de minha mente: uma camionete Chevrolet azul-claro e branca, no asfalto novo – como era chamada a avenida – em frente a barraca de caldo de cana do negro Cazuza e o Mercado Changai, de Valdomiro Moraes.
Wilson Chagas, um homem doce e amável, de bigode, gravata e guarda-chuva, marido de Dona Alzira Spinelli, aquariano, fazia aniversário na mesma semana que eu. O casal era amigo de minha mãe. Nós morávamos à esquerda dele. Sua trágica morte causou uma grande comoção na então Rua 25 de Agosto, Alto Maron, no dia de Santa Bárbara. Dona Bazinha, filha-de-santo, devota de Iansã, preparava um caruru com dois mil quiabos. Esse fato marcou para a sempre a minha vida.
Wilson Chagas era um comunista convicto, um militante nas terras grapiúnas. Trabalhou nos Correios, na Companhia de Luz e Força, e na Prefeitura de Itabuna. Deu uma grande contribuição à democracia sulbaiana, onde a Ação Integralista Brasileira, de Plínio Salgado, tinha uma atuação marcante: em Ilhéus com o fazendeiro e médico Raimundo do Amaral Pacheco; em Itabuna, com o comerciante e fazendeiro José Nunes de Aquino. Assim como hoje, o forte argumento do Integralismo era o anticomunismo. Filiado ao PCB, Seu Wilson enfrentava o discurso do Estado Novo de que os partidos eram uma ameaça à unidade nacional, justamente quando os comunistas uniam os trabalhadores em sindicatos e construíam agremiações partidárias com caráter nacional, consistência programática e identidade própria.
Com Dona Alzira teve dois filhos: Vladimir Spinelli Chagas, “Chaguinha” – em homenagem a Lênin, líder da Revolução Russa – e Judite, professora, mãe do militante petista e líder estudantil Wilson Chagas Neto.
De poucas palavras, Seu Wilson era um homem letrado. Era alcoólatra e tinha Tejo, um cão de estimação. Olhava-me com fraternidade, dizia que eu era inteligente. Tratou-me como gente, me deu brinquedos e histórias infantis. Cidadão honrado e decente que combateu a opressão e o arbítrio, que me fez enxergar o Mundo de uma forma diferente, mais humana.
Cinco décadas depois – tardiamente, quem sabe – eu registro a morte trágica de um cidadão, um homem que luta em defesa da liberdade. Cinquenta anos, pois, para lembrar a memória de um resistente democrático.
Seu Wilson era um libertário, e dentro do meu coração – com certeza – está guardado um pedaço dele.
Ederivaldo Benedito é radialista, jornalista, bacharel em Direito e ativista social.
10 respostas
Parabéns amigo Bené! Parabéns pela belíssima história de um cidadão Itabunense. Eu, particularmente sou um apaixonado por história de uma forma geral, mas história de um Itabunense é mais emocionante. Abços!
Bela história Ederivaldo! Sempre bom lembrar de quem realmente luta e lutou por essa cidade. Obrigado pela partilha da memória!
Obrigada pela homenagem ao meu avô paterno.Infelizmente não o conheci.
*Avô materno.
Obrigada, Ederivaldo! Mesmo sem ter conhecido meu avô materno…fiquei muito emocionada. Gratidão!
Querido Bené, você emocionou a nossa família, minha Mãe é meu Tio, filhos de Wilson Chagas se emocionaram.. Obrigada, pelo carinho com meu Avô.. lindas suas palavras q descreveu,tão bem,o homem de bem q ele era .. fico muito grata.. um forte abraço ..
Somente alguém tão bom e sensível semelhante a meu pai,para fazer tão bela homenagem!
Painho era realmente tudo isto:humano,honesto,idealista e extremamente inteligente (parecia estar um século à frente como dizem ser os aquarianos evoluídos).
Como agradecer meu amigo?! Esta tua iniciativa tocou profundamente meu coração! Que O Criador te cubra de bênçãos! Eternamente grata!
Agradeço ao meu grande amigo Benedito um grande fã do meu avô por essa homenagem ao meu avô a quem tenho orgulho de herdar o nome e um pouco da militância,agradeço também a equipe do pimenta pelo espaço e especial ao Davidson obrigado no fundo do coração,recebi hoje com emoção o carinho de alguns amigos que leram a matéria e alguns que tem a mesma ideologia do meu avô se emocionou ao ler a história desse grande militante que lutou pelos seus ideais com uma coragem de poucos sem temer a ditadura do estado novo do senhor Getúlio Vargas que perseguia comunistas em todo país,eu e Benedito já tivemos muitas conversas sobre meu avô e seus ideais e lamento eu e todos os seus netos de não ter a felicidade de conhecer-lo mas a luta continua por um País e o mundo melhor como ele queria,atenciosamente Wilson Chagas Neto.
Salve o Integralismo brasileiro e essas personalidades memoráveis que sonharam um País dos brasileiros para os brasileiros. Diferentemente o oposto do que vemos até o governo passado. Enfim, hj nos abre uma nova esperança como um bálsamo, ao ser eleito um nacionalista.
NADA CONTRA O COMUNISMO, MAS CONTRA QUEM TOMOU POSSE DOS PARTIDOS 30 40 ANOSNDEPOIS, PARA USURPAREM O DINHEIRO DE NOSSOS IMPOSTOS. OS HOMENS NESSA ÉPOCA ERAM OUTROS E SEUS IDEAIS PASSAVA PELA HONESTIDADE E RESPEITO.