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Ederivaldo Benedito || ederivaldo.benedito@gmail.com

 

Só mudará quando o itabunense passar a ter um sentimento de pertencimento coletivo por esta terra e repetir, como um mantra, os versos da saudosa poetisa Valdelice Pinheiro: “Eu sou plantada neste chão. Este chão sou eu”.

 

Itabuna é uma cidade de todos e também me pertence. Mas, historicamente, na visão da maioria dos habitantes, sempre teve donos. Mandatários que, após travarem lutas sangrentas e mortais, eliminaram os opositores, assumiram o domínio desta terra, forjaram o mito das “famílias tradicionais” e, imaginariamente, construíram a chamada “elite cacaueira”. Como herança, esses donatários deixaram o poderio, a soberba, a pose, o nariz empinado, a negação do outro. A posse e o uso da força, que fizeram parte do cotidiano dos antepassados, está no DNA do itabunense.

A cidade moldada sob a égide do autoritarismo, construída à sombra do coronelismo, caminha para os seus 110 anos. Mas, ao que parece, a convivência acadêmica e o avanço tecnológico não conseguiram “criar uma mentalidade coletiva”. Itabuna, como nos velhos tempos, ainda traz um ranço da terra onde impera a força, nega o diálogo e cultua a prática da desarmonia social. Aceita conviver com o fantasma do individualismo e preserva as desavenças e disputas pessoais. Aqui sempre mandou quem impôs a sua força, falou mais alto e não respeitou o direito do outro. Hoje, como ontem, o domínio territorial é disputado pelos autoproclamados donos.

Ora, se historicamente Itabuna tem donos, é uma cidade que, na ótica da maioria dos itabunenses, não lhe pertence e o cuidar, o preservar é uma tarefa exclusiva dos seus proprietários. Não se sente nessa condição. Não gosta e não se identifica com os supostos possuidores, que são poderosos. Como não pode confrontá-los nem tem meios de enfrentá-los, a alternativa é destruir o seu bem, seu instrumento de poder e de opressão: a cidade.

A ausência do sentimento de preservação dos bens públicos, a não preservação dos espaços de uso comum, a destruição dos monumentos históricos, a falta de conservação das vias urbanas, o desprezo pelas questões públicas, o estado de abandono em que se encontra Itabuna seriam um recado direto aos donos da cidade? As pichações e ação os vândalos consequências desse fenômeno? As ações criminosas poderiam ser analisadas por esse prisma, com base na premissa apresentada?

Se não, como explicar, então, a crescente onda de criminalidade na cidade que, desde 1979 – portanto, há quatro décadas – vem assustando a população itabunense? E o flagrante e evidente sentimento de letargia e apatia coletivas diante do estado em que se encontra a cidade, ao longo dos últimos quarenta anos? Estaria o itabunense numa espécie de cegueira saramaguiana? Uma apatia coletiva e um crescente processo histórico de desamor por esta terra? Um quadro de enfraquecimento dos seus vínculos sociais e da perda da capacidade de regular o seu comportamento para reconstruir a cidade?

São indagações não tão fáceis de serem respondidas. No entanto, temos uma certeza: o itabunense – principalmente o que dela não se sente dono – hoje, mais do que nunca, necessita nutrir um sentimento de pertencimento por esta terra, reaprender a preservá-la. Fala-se muito em defesa da cidade. Porém, se todos os habitantes, realmente, amassem e lutassem pelo seu desenvolvimento, Itabuna não seria uma terra rasada, devastada, tão desprezada.

Uma diferente forma de amor – talvez, quem sabe – em reações boquirrotas nas mesas de bares, nas lamúrias dos grupos de WhatsApp e nas reclamações aos programas de Rádio. Manifestações que atingem os donos da cidade e não contribuem para mudar o status quo. Mas só mudará quando o itabunense passar a ter um sentimento de pertencimento coletivo por esta terra e repetir, como um mantra, os versos da saudosa poetisa Valdelice Pinheiro: “Eu sou plantada neste chão. Este chão sou eu”.

Porque Itabuna é uma cidade que tem donos, também me pertence!

Ederivaldo Benedito é jornalista, bacharel em Direito, ativista social e pós-Graduado em Direito Penal e Criminologia.

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