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A reforma psiquiatra brasileira foi positiva para a assistência em saúde mental, mas o falta vontade política dos governantes para colocá-la em prática, na opinião de Luiz Cezar Melo, 65 anos, mais de 30 deles dedicados à Psiquiatria. Luiz Melo faz críticas ao arremedo que se fez de assistência psiquiátrica nos municípios, principalmente Itabuna. As consequências, aponta, podem ser vistas nas ruas.

Numa entrevista ao PIMENTA, Luiz Melo observa que praticamente se destruiu o pouco que havia no município, principalmente nos últimos quatro anos. O psiquiatra observa, por exemplo, que o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) nível 3 começou a ser construído e não foi entregue até o momento. Ele apela ao prefeito eleito, Augusto Castro, para que conclua o equipamento e faça valer o que preconiza a reforma psiquiátrica.

BLOG PIMENTA – Na opinião do senhor, a assistência psiquiátrica em Itabuna é a ideal?

Luiz Cezar Melo – Como especialista em saúde mental há quase 30 anos, na Apae, Caps e serviço de ambulatório, vejo que a situação tem piorado e não há perspectiva de melhora. Se antes tínhamos sistema que funcionava precariamente, hoje está muito pior e aquém do desejado.

O que difere o antes do momento atual?

Tínhamos hospital funcionando em sistema de mega-asilo, de pessoas confinadas. Depois da reforma psiquíatrica, tentou-se sistema mais racional. Existia, também, o ambulatório da Prefeitura, no Hospital de Base, que funcionava de forma precária, e atendia demanda de Itabuna e região. Funcionava? Pelo menos, os pacientes eram vistos de três em três meses. Havia constância, não havia intervalo muito grande entre um atendimento e outro. Hoje, foi criado ambulatório no Centro, simplesmente arremedo de atendimento psiquiátrico. A pessoa que tem sofrimento mental, quando consegue atendimento, é seis, oito meses depois. O atendimento é precário, com receita emitida, replicada, treplicada.

Quais os riscos para o paciente?

O indivíduo não tem muito contato com quem está tratando dele. Não há avaliação. A pessoa tem que ser avaliada, pelo menos, de três em três meses, mas é vista em intervalor de seis, a 10 meses até. Essa pessoa pode reagudizar, paralisar. E o indivíduo fica na rua. Os familiares sabem bem o que é isso, de ter doente mental em casa e não ter a quem recorrer, não ter o que fazer.

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A saúde mental sempre foi jogada de lado, patinho feio da saúde, que é o patinho feio do orçamento geral de um município.

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Não há alternativa?

A alternativa acaba sendo o serviço particular, que são as clínicas populares, que têm consulta relativamente barata para quem é de classe média, mas não privilegiado tirar R$ 200 do seu orçamento é muito. Esse é um dever do Estado e um direito do cidadão, atendimento público e gratuito. A saúde mental sempre foi jogada de lado, patinho feio da saúde, que é o patinho feio do orçamento geral de um município.

A reforma psiquiátrica foi positiva? Por que ela não está funcionando como preconizado em Itabuna?

A reforma psiquiátrica foi muito positiva com o fim do confinamento. Dificilmente alguém se recupera tendo a sua liberdade limitada e sofrendo maus-tratos e sobrevivendo com o mínimo possível. Era uma solução quando não se tinha algo melhor. A reforma psiquiátrica trouxe uma novidade que é o atendimento na comunidade. Se ela fosse implantada com eficácia, apoio público, vontade política, se a doença mental não fosse tão discriminada e relegada a segundo, a terceiro plano até, talvez ela tivesse…

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O Caps não é um ambulatório a mais. Trabalha em rede, trabalha com o PSF. O único Caps que funcionou bem foi o de Ibicaraí.

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Há bons exemplos de mudança depois da reforma psiquiátrica?

Em alguns lugares, ela floresceu. A reforma prevê que o indivíduo seja tratado na própria comunidade, sem precisar afastá-lo de quem ele gosta, da sua família, porque foi jogado no meio de outras pessoas também doentes. A reforma foi perfeita ao criar o Caps, que encara a doença mental como digna de ser excluída da sociedade, e sim uma tentativa de incluir esse doente que, por algum momento, perdeu a razão, de torná-lo capaz de ser um cidadão. O Caps não é um ambulatório a mais. Trabalha em rede, trabalha com o PSF. O único Caps que funcionou bem foi o de Ibicaraí.

O que deu certo no município sul-baiano?

Em Ibicaraí, tínhamos os três dispositivos da reforma psiquiátrica, que é o Caps, o serviço de residência terapêutica para pacientes que não tivessem referência familiar, o paciente de rua, e o internamento em hospital público. O hospital tinha 3 leitos de psiquiatria. Os pacientes que agudizavam ficavam lá por algum tempo. O período de internamento era mínimo, não saíam da cidade. O paciente recebia o tratamento e voltava para a sua comunidade, dessa vez já com orientação para se tratar no Caps.

Por que Itabuna não avança, embora ainda seja polo em serviços de saúde?

Itabuna tem quatro dispositivos (Caps 2, Caps Infância e Adolescência e Caps Álcool e Drogas) e tem um outro Caps que nunca funcionou e está sendo construído há vários mandatos e ninguém se arvora de terminar. É um Caps que prevê internamento. Ou seja, estaria solucionando um vácuo que o Hospital São Judas deixou. Porque o paciente estaria sendo internado na crise e depois voltaria para o seu ambiente familiar.

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O indivíduo que descompensa não tem a assistência imediata devida. São usados os hospitais gerais, mas estes não atendem completamente. O indivíduo que adoece não tem um sistema para atendê-lo.

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Quais são os efeitos, as consequências da falta de assistência psiquiátrica em Itabuna?

A consequência é o aumento de número de suicídio, pois o indivíduo que descompensa não tem a assistência imediata devida. São usados os hospitais gerais, mas estes não atendem completamente. O indivíduo que adoece não tem um sistema para atendê-lo. Temos aí Roça do Povo que poderia ser usado como oficinas terapêuticas, oficinas protegidas, sistema que dá certo em algumas cidades da Bahia, onde o paciente psiquiátrico, que só é improdutivo na crise, poderia ser encaminhado para poder aprender uma atividade. Ibicaraí chegou a receber prêmio nacional como Caps modelo. Lá, funcionava em rede. Há solução, não há é vontade política.

Há recursos federais para essas ações?

Sim, não para construção, mas para assistência. A parte maior do recurso vem do governo federal. Já deveria estar construído e funcionando aqui o Caps 3, com internamento e psiquiatra de plantão. Isso demorou de ser implantado no Brasil inteiro. Salvador agora que tem, inclusive o CAPS 3 AD, que é de emergência para alcoolismo e drogas, mas, de fato, demorou muito para ser implantado na Bahia.

Por que, no geral, relegam a assistência na área de saúde mental a terceiro, quarto plano?

Primeiro, porque quem adoece não interfere muito na dinâmica econômica da sociedade. O doente mental é invisível, porque ele não vota. Se vota, vota apenas quando sadio. Ele não produz, não é consumidor. Então, é relegado a segundo plano, porque é invisível. No sistema capitalista, ele não tem cartão de crédito. Uma sociedade que confunde cidadania com consumo…

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O doente mental é relegado a segundo plano porque é invisível. No sistema capitalista, ele não tem cartão de crédito. Uma sociedade que confunde cidadania com consumo…

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Não tem valor para essa sociedade?

A não ser que se trate de um grande executivo que adoeça. Ou dono de uma firma ou que seja alguém importante para o sistema. Mas se for pessoa humilde, menos privilegiada, e para o lugar que ele está saindo na empresa tiver 10, 20 para ocupar o lugar, ninguém vai se preocupar em recuperar essa pessoa, já que há exército de reserva muito grande.

Os governos, além de não observarem o doente, fecham os olhos para os efeitos dessa desassistência na família?

Exato. Existe toda uma dinâmica familiar que é afetada. Quem é que vai cuidar deste doente quando está em casa? Por isso que o hospital psiquiátrico parece opção mais viável para alguns. “Não, eu deixo ele lá, não me preocupo mais com ele, vou fazer minhas coisas”. Isso, mesmo sabendo que ele pode estar sendo maltratado.

E poucos também sabem lidar em um momento de crise…

Por isso, louvo muito a reforma psiquiátrica. Pelo menos, na ideia é ótimo. Os Caps estão preocupados com a saúde mental. Então, os familiares podem frequentar os Caps até para ter noção do que fazer e não fazer quando o paciente entra em crise. Há um aprendizado, também. Há muito cuidador de doente mental que, depois, resolve cursar auxiliar de enfermagem ou serviço social, agente comunitário de saúde. Existe um desconhecimento não apenas do público em geral, mas de profissionais da área da saúde também, porque não querem lidar com pessoas que adoecem, pois há o estigma de que doente mental é perigoso, violento. É um estigma.

Preconceito?

Os estudos indicam que o doente mental não é mais violento do que a população em geral. É que os crimes, quando cometidos por doentes mentais, são mais alarmantes, pois há perda do controle, porém não são tão comuns. E aí gera o estigma. Os normais, às vezes, cometem crimes muito mais violentos que os doentes mentais.

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O doente mental que não é bem tratado ou que não consegue esse espaço (atendimento) no serviço público para se tratar, ele se torna quase uma bomba-relógio.

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E aí, retornamos para a questão inicial das consequências da falta de assistência na rede pública, não é mesmo?

O indivíduo que não é bem tratado ou que não consegue esse espaço (atendimento) no serviço público para se tratar, ele se torna quase uma bomba-relógio. O cara que passa um tempo sem ver psiquiatra, sem renovar ou revisar a medicação, pode surtar num período desses e cometer um crime. Mas se é visto, pelo menos, de três em três meses, diminui-se essa possibilidade. Vejo doentes mentais que esperavam consulta há nove meses e descompensaram nesse período, cometendo crime. Se tivesse atendimento, provavelmente não teria cometido o crime. Ou seja, estamos falando de prevenção também.

A reforma psiquiátrica abre espaço para o convívio, a integração. Qual o peso dessa integração para a saúde mental deste paciente?

Se o indivíduo se acha mais aceito, menos discriminado e confia na capacidade dele, isso já é terapêutico por si só. Mas se o indivíduo é isolado, discriminado, claro que vai agravar. Um exemplo bom disso: em Ibicaraí, havia programa chamado Pintando a Cidade. O artista plástico levava os doentes mentais para a rua para pintar as guias, calçadas, jardins… Então, a população em geral, de lá, se acostumou a ver estas pessoas produzindo, trabalhando, coisa que não imaginava, e sem essa aura de perigo. O artista recolhia no comércio as tintas e ele reformava, fazia as tintas e pintava e deixava os usuários do Caps trabalhando. Eles nunca poderiam imaginar que o doente mental poderia produzir alguma coisa, inclusive para a cidade. Então, esse tipo de coisa eu nunca vi aqui em Itabuna. É até uma sugestão para o governo que está entrando…. Eu sei que doente mental não dá voto, mas se ele quer ser um bom gestor, porque não terminar o Caps 3, porque não colocar equipes eficientes nos Caps e não voltar o ambulatório geral? É tornar o doente mental visível. Mostrar que ele não é violento. É violento quando não é tratado adequadamente.

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Eu sei que doente mental não dá voto, mas se ele quer ser um bom gestor, porque não terminar o Caps 3, porque não colocar equipes eficientes nos Caps e não voltar o ambulatório geral? É tornar o doente mental visível.

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Quais são os reflexos da falta de assistência para a cidade?

Quem nunca viu um doente mental na rua quebrando patrimônio ou sendo vítima de chacota e provocações? Há quem não o compreenda e começa a provocá-lo, xingá-lo, ver, realmente, o circo pegar fogo. Há pouco tempo, havia um que quebrava carros… Ah, porque não tem mais o São Judas (clínica psiquiátrica). Que tivesse, mas o São Judas não era tudo. A pessoa não ia ficar a vida inteira lá. Então, se não cuidar para que ele aprenda outro comportamento e não seja provocado, porque não implantar um sistema desse? Sai mais caro recuperar patrimônio destruído por ele.

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Villas Boas: medidas de proteção a jovens e adolescentes (Foto Alfredo Filho).
Villas Boas: medidas de proteção a jovens e adolescentes.

A Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab) determinou a adoção de medidas necessárias para proteger e orientar adolescentes devido a suspeitas de tentativas de suicídio estimuladas pelo jogo virtual Baleia Azul. O secretário da saúde Fábio Vilas-Boas anunciou força-tarefa para investigar casos de jovens que procuraram assistência hospitalar nos últimos dias por causa de atos de automutilação e outros ferimentos autoprovocados.

“A orientação aos pais e educadores dos jovens é que se registre a ocorrência, seja preservado o material (celular e/ou computador) e prestado atendimento médico imediato”, disse Vilas-Boas. A Sesab determinou que hospitais, prontos socorros, unidades de saúde e demais serviços de atendimento médico na Bahia redobrem a atenção em situações de automutilação e uso inadequado de medicamentos por crianças e adolescentes.

Para a família, a recomendação é que, ao identificar algum comportamento suspeito, leve a criança ou adolescente para a unidade de saúde mais próxima. “A situação é delicada e os pais devem ficar atentos ao comportamento de seus filhos. Trata-se de um jogo criminoso que tomou conta das redes sociais e está vitimando crianças”, observa.

Uma nota técnica da secretaria vai orientar a conduta dos profissionais de saúde frente a este tipo de situação. Além disso, uma rede de serviços esta à disposição para dar suporte aos casos que forem registrados, tanto com assistência clínica quanto psicológica, em unidades como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e o Núcleo de Prevenção ao Suicídio do Centro Antiveneno da Bahia.

Caso haja algum sinal de automutilação, o encaminhamento deve ser feito para o pronto socorro, de um hospital ou de uma Unidade de Pronto Atendimento 24h (UPA). Órgãos de saúde, educação e segurança pública estão trabalhando em conjunto para dar uma resposta à sociedade frente a este grave problema.

SINAIS DE ALERTA

Adolescentes saudáveis também podem ser atraídos pelo jogo por curiosidade ou pela sedução do proibido e acabar se colocando em perigo. Por isso, é importante ficar atento aos sinais de que os filhos possam estar entrando na brincadeira ou estejam precisando de ajuda.

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Importante é manter as crianças e adolescentes protegidos e com a assistência necessária. Em casos de identificação de comportamentos suicidas, deve-se ligar para Centro de Informações Antiveneno (0800 284 4343), que funciona 24 horas, ou para o telefone 141, para receber orientações de como proceder.

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Rosivaldo PinheiroRosivaldo Pinheiro | rpmvida@yahoo.com.br

 

O entendimento hoje é de que manicômios não ressocializam; eles alienam e excluem, por isso precisam ser substituídos pelos CAPS.

 

Nossa vida é cheia de surpresas, e nossa mente aprende obrigatoriamente a se adaptar à adversidade, mas nem sempre conseguimos manter intacta nossa estrutura psicológica e nem todos reagem bem a um mesmo estímulo estressante. Em um debate com amigos no Dia do Assistente Social e da Família, lembramos como é fundamental ao ser humano o auxílio profissional adequado e o apoio familiar para superar os males da mente.

Olhamos a vida passar e as pessoas que passam por nós ou convivem conosco podem estar com sérios problemas psicológicos. Advogados, médicos, operários, comerciantes… Ninguém está imune às fragilidades presentes na estrutura mental humana. Quando pensamos que a reação desproporcional de uma pessoa é um capricho, pecamos, estamos sendo rasos e nosso olhar não atende à profundidade necessária da questão.

Quando o problema vai além e se torna um caso psiquiátrico, o primeiro olhar e sentimento nos levam na direção do pré-julgamento; passando a entender melhor o assunto, percebemos a necessidade da mudança no paradigma de enfrentamento e tratamento dos males da psique. Os seres humanos, com toda sua força e capacidade racional, são frágeis; nosso calcanhar de aquiles é a mente.

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O deputado estadual Capitão Fábio (PRP) rebateu o presidente do PMDB baiano, Lúcio Vieira Lima, que o acusou de ser “pé frio” e de nunca ter apoiado o PMDB. Fábio reafirmou que lutará pela reeleição de Jaques Wagner e considera o peemedebista uma carga pesada.
– Lúcio é uma mala. Prejudicou minha campanha a prefeito, levando-me a desistir, e agora tá prejudicando a candidatura de Geddel.
Para o deputado, a candidatura a governador de Geddel é “barca furada”, que afundaria mais rápido com “a mala pesada chamada Lúcio Vieira Lima”. Fábio afirmou que estará ao lado de Wagner nas carreatas desta sexta-feira, 3, nos municípios de Ilhéus (9 horas), Itabuna (11 horas) e Uruçuca (13 horas).

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Se o problema das drogas é uma preocupação social da maior gravidade, em Itabuna o tratamento que  o governo municipal confere ao Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (Caps AD) vai totalmente na contramão do que deveria ser a postura correta do poder público.

O Caps, que é mantido com verbas federais, é menosprezado pelo secretário municipal da Saúde, Antônio Vieira, que não disponibiliza os recursos mínimos para a prestação de um serviço digno. E ainda existem situações absurdas, como o funcionamento em um imóvel precário (o telhado ameaça desabar), de péssima localização e pelo qual o erário desembolsa um aluguel mensal de R$ 4.500,00.

Outra: um veículo (Kombi), que deveria ser usado para o deslocamento de pacientes do Caps, tem servido ao transporte de material de construção e até de animais. Um absurdo total!

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A prefeitura de Itabuna deixou cerca de 40 servidores e pacientes do Centro de Atenção Psicossocial (Caps 2) com fome, nesta terça. Só às 12h30min um preposto da Secretaria de Assistência Social informou da suspensão das refeições.

Houve reclamação geral, principalmente porque os atendidos na unidade chegam logo cedo e saem só à tarde – além de sofrerem de problemas de saúde mental.

As refeições são fornecidas, de segunda a sexta, pelo Restaurante do Povo, unidade criada pelo Governo Federal e mantida pelo município. Até agora, no entanto, ninguém explicou por que motivo as refeições foram suspensas.