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Gostaria de escrever o primeiro texto do ano de 2010 sobre esse povo fantástico que é o brasileiro e sua classe política, tão honesta e imaculada.
Para falar de hoje, no entanto, vamos nos reportar aos anos de 1958 a 1963 e 1966 a 1969. O que aconteceu durante esses períodos? Foram as épocas em que atuaram por aqui dois diplomatas ingleses, que deixaram escritas suas impressões sobre o Brasil, as quais transcreverei para uma reflexão.
O primeiro, sir G. A. Wallinger, embaixador no Rio de Janeiro, deixou treze páginas em 1963 sobre o nosso país, quando da sua despedida, uma praxe entre os diplomatas ingleses chamada de valedictory despach – uma espécie de carta livre extra-oficial. Em alguns trechos podem ser lidos:
“Um aspecto a salientar é que todo governo no Brasil ainda é intensamente “personalista”. Os três presidentes a que me refiro são chamados, simplesmente, de Juscelino, Jânio e Jango. O tamanho do poder em mãos de um presidente brasileiro é relativamente maior do que o poder do presidente dos Estados Unidos, visto que, desde os tempos de Getúlio Vargas, o Congresso nunca conseguiu se contrapor a ele… Embora o presidente dependa do Congresso para a aprovação de leis, a influência do Poder Legislativo na condução da política está viciada pela natureza primitiva da organização dos partidos políticos. Os partidos, apesar das implicações ideológicas de suas denominações, são essencialmente clubes políticos, criados para prover máquinas eleitorais a seus membros; estes, por sua vez, são homens que optaram pela atraente, lucrativa e “suja” carreira política; são frequentemente desprovidos de qualquer compromisso social ou ideológico, ou do sentido de servir à nação. Como conseqüência, a lealdade partidária é subordinada ao interesse próprio”.
Um achado político extraordinário e que mostra, desde lá, os vícios que se perpetuam no poder e que não fazemos, nós, população, nada para contrariar.
O outro embaixador, sir John Writhesley Russell, na sua despedida, não deixou por menos. Em 1969, elaborou seu último despacho oficial elencando a riqueza do país e, no item 10, pergunta: “Por que, então, o Brasil não é um país rico e próspero?” Na resposta, Russell coloca:
“O estado da Guanabara tem mais funcionários públicos do que Nova York; a Petrobras, só em São Paulo, emprega um número maior de químicos do que a Shell no mundo inteiro; pode-se comprar qualquer coisa – de uma carteira de habilitação a um juiz do Supremo Tribunal Federal; o reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro ganha 500 cruzeiros mensais, enquanto os aluguéis são três vezes mais altos do que em Londres e os hotéis da cidade estão entre os mais caros do mundo (e entre os de pior atendimento); o país tem apenas 18 mil milhas de estradas asfaltadas e em 1968 os brasileiros mataram 10 mil pessoas nas estradas – mais do que o total de soldados americanos mortos no Vietnã no mesmo ano. Como já escreveu Peter Fleming, ‘o Brasil é um subcontinente com um autocontrole imperfeito’”.
Ano novo, vida nova? Renovação em todo final e começo de ano? Festas de boas-vindas ao ano bom que se inicia? Nada disso parece ser efetivamente feito no Brasil, desde longas datas.
Por isso, ao comemorar as festas nesse ano que se encerra e neste ano que começa, pense na conjuntura político-cultural em que estamos vivendo, construindo e perpetuando para as gerações vindouras. Só depois, deposite os seus votos na urna da esperança que realmente renova!

Gustavo Atallah Haun | g_a_haun@hotmail.com

Gostaria de escrever o primeiro texto do ano de 2010 sobre esse povo fantástico que é o brasileiro e sua classe política, tão honesta e imaculada.

Para falar de hoje, no entanto, vamos nos reportar aos anos de 1958 a 1963 e 1966 a 1969. O que aconteceu durante esses períodos? Foram as épocas em que atuaram por aqui dois diplomatas ingleses, que deixaram escritas suas impressões sobre o Brasil, as quais transcreverei para uma reflexão.

O primeiro, sir G. A. Wallinger, embaixador no Rio de Janeiro, deixou treze páginas em 1963 sobre o nosso país, quando da sua despedida, uma praxe entre os diplomatas ingleses chamada de valedictory despach – uma espécie de carta livre extra-oficial. Em alguns trechos podem ser lidos:

“Um aspecto a salientar é que todo governo no Brasil ainda é intensamente “personalista”. Os três presidentes a que me refiro são chamados, simplesmente, de Juscelino, Jânio e Jango. O tamanho do poder em mãos de um presidente brasileiro é relativamente maior do que o poder do presidente dos Estados Unidos, visto que, desde os tempos de Getúlio Vargas, o Congresso nunca conseguiu se contrapor a ele… Embora o presidente dependa do Congresso para a aprovação de leis, a influência do Poder Legislativo na condução da política está viciada pela natureza primitiva da organização dos partidos políticos. Os partidos, apesar das implicações ideológicas de suas denominações, são essencialmente clubes políticos, criados para prover máquinas eleitorais a seus membros; estes, por sua vez, são homens que optaram pela atraente, lucrativa e “suja” carreira política; são frequentemente desprovidos de qualquer compromisso social ou ideológico, ou do sentido de servir à nação. Como conseqüência, a lealdade partidária é subordinada ao interesse próprio”.

Um achado político extraordinário e que mostra, desde lá, os vícios que se perpetuam no poder e que não fazemos, nós, população, nada para contrariar.

O outro embaixador, sir John Writhesley Russell, na sua despedida, não deixou por menos. Em 1969, elaborou seu último despacho oficial elencando a riqueza do país e, no item 10, pergunta: “Por que, então, o Brasil não é um país rico e próspero?” Na resposta, Russell coloca:

“O estado da Guanabara tem mais funcionários públicos do que Nova York; a Petrobras, só em São Paulo, emprega um número maior de químicos do que a Shell no mundo inteiro; pode-se comprar qualquer coisa – de uma carteira de habilitação a um juiz do Supremo Tribunal Federal; o reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro ganha 500 cruzeiros mensais, enquanto os aluguéis são três vezes mais altos do que em Londres e os hotéis da cidade estão entre os mais caros do mundo (e entre os de pior atendimento); o país tem apenas 18 mil milhas de estradas asfaltadas e em 1968 os brasileiros mataram 10 mil pessoas nas estradas – mais do que o total de soldados americanos mortos no Vietnã no mesmo ano. Como já escreveu Peter Fleming, ‘o Brasil é um subcontinente com um autocontrole imperfeito’”.

Ano novo, vida nova? Renovação em todo final e começo de ano? Festas de boas-vindas ao ano bom que se inicia? Nada disso parece ser efetivamente feito no Brasil, desde longas datas.

Por isso, ao comemorar as festas nesse ano que se encerra e neste ano que começa, pense na conjuntura político-cultural em que estamos vivendo, construindo e perpetuando para as gerações vindouras. Só depois, deposite os seus votos na urna da esperança que realmente renova!

Gustavo Atallah Haun é professor

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