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Felipe de PaulaFelipe de Paula | felipedepaula81@gmail.com

Duas alunas minhas, do sertão alagoano, estão em Portugal, na Universidade de Coimbra. Outros tantos pensam em pós-graduações. Vislumbram ser professores da casa, em sua região, revolucionar escolas, seus espaços. Enxergam novos horizontes.

Vivemos um período de reconfiguração da noção de educação e conhecimento. Há um tempo, não muito distante, a oportunidade de possuir conhecimento era para muito poucos. Pierre Lévy, filósofo tunisiano radicado no Canadá, faz perfeita analogia: antes, a busca pelo conhecimento assemelhava-se a escalada de uma pirâmide. De uma base larga, iam estreitando os espaços e, consequentemente, o acesso. Poucos chegavam ao topo. Hoje, complementa ele, a busca pelo saber é semelhante ao surfe, onde em meio a um mar revolto, repleto de informações, devemos nos equilibrar e fazer guinadas de direção em busca daquilo que nos serve. E, o principal, aí já reflexão nossa, o mar possibilita espaço amplo, acesso irrestrito.
Vive-se o tempo do conhecimento livre. Como Thomas Friedman afirmou em recente artigo: todo conhecimento está no Google. Não importa o que você sabe, mas o que você pode fazer com o que você sabe. Disso concluímos que o papel do educador também se reformula. Não se admite mais a ideia de um professor soberano, dono de todo o conhecimento. Este deve ser um mediador, um debatedor, um monitor no direcionamento do aluno rumo ao saber – construído em conjunto, em debates, em diálogos.
Essa nova configuração da educação oferece alguns incômodos. Aqueles que estavam habituados a dispor de diferencial na sociedade por possuírem o monopólio do conhecimento passam a conviver com a sensação de ter seu domínio ameaçado. Aí, observamos o professor que não sabe lidar com as questões de seu aluno. Aí, observamos também o incômodo com a ampliação do acesso às universidades, com a sua interiorização, com as cotas.
Os rumos das políticas públicas da educação superior brasileira é assunto incendiário. Vozes se levantam contra a inserção de alunos oriundos de escolas públicas através da reserva de vagas. Baixarão o nível da universidade brasileira! Criarão um sistema bi-racial! Os cotistas não conseguirão acompanhar o nível! Isso não se confirmou.
Tomando o exemplo da UFBA, já se vão oito anos da implantação e os índices quali-quantitativos da universidade só têm crescido. Já no primeiro vestibular com as cotas (2005), a diferença de índice não chegou nem a cinco décimos. Nível mantido, porém com inclusão. E o mesmo ocorre se observarmos qualquer universidade.

Além disso, outro argumento comum é a afirmação de que se deve investir no ensino fundamental e médio. Para isso, tomo a liberdade de citar o Memorial da Universidade Nova, publicado pela UFBA:
“As ações de melhoria do ensino fundamental e do ensino médio, por mais amplas e efetivas que venham a ser, demandam tempo para que produzam resultados expressivos. Aguardar tais resultados, mesmo admitindo que investimentos com esse objetivo pudessem começar de imediato, significaria adiar por cerca de uma década a vigência de mudanças significativas no quadro de iniqüidades na educação superior publica. Enquanto isso, muitos estudantes, mesmo atingindo a média necessária para ingresso na universidade, não conseguiriam nela entrar pela desigualdade na competição.”
Duas alunas minhas, do sertão alagoano, estão em Portugal, na Universidade de Coimbra. Outros tantos pensam em pós-graduações. Vislumbram ser professores da casa, em sua região, revolucionar escolas, seus espaços. Enxergam novos horizontes. Jovens que antes da chegada da Universidade percebiam o miserável comércio local, uma pequena fábrica de tecidos, o corte de cana, como alternativas de vida. E agora? Melhor do que qualquer crítico, esses jovens sabem discorrer sobre como a interiorização, a ampliação do acesso universitário, influenciou as suas vidas e a comunidade.
O incômodo causado por essas políticas é dar para muitos aquilo que era de poucos privilegiados: o saber, o conhecimento, o pensamento crítico, a titulação, a chance de mudar a própria realidade.
Felipe de Paula é professor da Universidade Federal de Alagoas (Ufal).

5 respostas

  1. Belo texto, exemplar comentário! Concordo com o autor. O brasileiro precisa de pensamentos sinceros como o desse professor, em defesa do ingresso dos nossos jovens pobres na Universidade. A educação, a inclusão acadêmica e o conhecimento científico é para todos e não só para a minoria abastada.

  2. “UMA MENTIRA MUITAS VEZES REPETIDAS TORNA-SE VERDADE-Joseph Goebbels”
    Estudantes da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro ocuparam dependências da reitoria. Protestam contra as péssimas condições da instituição. Considerando que Rio e São paulo são os estados onde outrora haviam os mais avançados campus universitários, fico a imaginar como devem andar os demais no resto do país.
    Os petistas torram verdadeiras fortunas em propaganda enganosas, a cada dia se cria uma nova universidade e tome-lhe mais propaganda, mas, em pouco tempo as recem criadas instituições param por falta de professores e até mesmo por falta de papel higiênico. tudo isso com a total colaboração das corporações sindicais e de importantes setores da imprensa.
    O mais dramático em tudo isso é que os setores que deveriam lutar pela excelência são hoje parte do problema. As entidades estudantis foram cooptadas pelo regime se tornaram suas assalariadas. A UNE se transformou no pior exemplo de peleguismo de que se tem notícia. Foi comprada. Os sindicatos de professores, do mesmo modo, são apenas extensões do poder, braços dos partidos políticos como o PT e o PCdoB, ambos dirigem a UNE. A imprensa, no geral, não dá muita bola para o assunto. Os nossos valentes editores estão ocupados em publicar temas que não desagrade o PT. O resto é conversa mole pra boi dormir.

  3. Calma Observador, estamos na era da globalização, o próprio texto do ilustre Felipe é uma mistura dos discursos de Lula com as falações do “FORO DE SÃO PAULO”, não fique tão apoquentado com a VEJA, não fosse ela não estariamos aqui debatendo assunto nenhum, pois a tão outrora odiada REDE GROBO já está na lista das gordas verbas de publicidade e dos empréstimos a fundo perdido do BNDS.
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    Mesmo com cotas, universidades estaduais e federais têm queda de alunos de escolas públicas nos vestibulares. Sabem por quê? Porque o governo escolheu o caminho errado sob o aplauso dos demagogos e o silêncio dos covardes(VEJA)

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