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PROTESTAR É NOVO, RESIGNAR-SE É VELHO

Ousarme Citoaian | ousarmecitoaian@yahoo.com.br

01ProtestoSe o Brasil todo protesta, também quero protestar, com bandeira, muita festa, muito pneu pra queimar: protesto contra a pobreza do falar e do escrever, protesto contra o não ler, protesto contra o viver como gado na invernada, protesto contra a cambada que não sabe protestar, protesto contra Galvão, aquele do “bem amigos”, protesto contra novela (não de livros, mas de tela), protesto contra os perigos que me espreitam em cada esquina, protesto contra a menina que não quer vestir timão, protesto contra o contralto, porque prefiro o tenor, protesto contra o gestor, daqui, dali, dacolá…

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Contra desvio, “malfeito” e sinecura

Protesto contra quem cala, quando devia falar, protesto contra quem fala, quando devia calar, protesto contra quem quer a volta da linha dura, protesto contra o protesto que não sabe o que procura, protesto contra o desvio, o roubo e a sinecura, protesto contra a loucura que acomete o governante, tornando este nosso inferno bem pior do que o de Dante, protesto contra essa gente que de protesto não gosta, protesto contra a proposta de se fazer referendo (essas coisas do Congresso eu só acredito… vendo!), meu pensamento explicito, eu prefiro plebiscito, povo dizendo o que presta, dinheiro fácil, água fresca, pagode, cachaça e festa…

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03ProtestoO tomate, o resgate e o “malfeito”

Protesto contra o tomate, que andou subindo de preço, protesto contra o resgate do que não tem meu apreço, protesto contra o “malfeito”, protesto contra o prefeito, por não se dar ao respeito com nossa população, protesto contra os serviços, saúde e educação (e estando com rima em “ão”, elevo este meu protesto contra a volta da inflação), protesto contra a ausência de vergonha em tanto rosto, o que só me traz desgosto a cada nova eleição, protesto contra o som alto, com música ruim a esmo, e em dia de mau humor, protesto… contra mim mesmo!

 

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DEUS PARECE AJUDAR MAIS A QUEM ESTUDA

Circula pela internet um texto chamado “Avisos paroquiais em Portugal” (também conhecido como “Avisos paroquiais no Brasil”) que possui seu quê de engraçado. Creio que, deixando de lado o lúdico, o material serve como atenção ao cuidado que devem ter os que escrevem (ou falam, embora a fala sempre seja mais “permissiva”). Cito uns desses achados à porta das igrejas: 1) “Na sexta-feira às sete, os meninos do Oratório farão uma representação da obra Hamlet, de Shakespeare, no salão da igreja. Toda a comunidade está convidada para tomar parte nesta tragédia”; 2) “Para todos os que tenham filhos e não sabem, temos na paróquia uma área especial para crianças”.
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05Sobre as águasJesus “desaparecido” durante milagre

Mais: 3) “Assunto da catequese de hoje: Jesus caminha sobre as águas; Assunto da catequese de amanhã: Em busca de Jesus”; 4) “Prezadas senhoras, não esqueçam a próxima venda para beneficência, uma boa ocasião para se livrar das coisas inúteis que há na sua casa. Tragam os seus maridos”; 5) “O coro dos maiores de sessenta anos vai ser suspenso durante o verão, com o agradecimento de toda a paróquia”; 6) “O torneio de basquete das paróquias vai continuar com o jogo da próxima quarta-feira. Venham nos aplaudir; vamos tentar derrotar o Cristo Rei”. Cristo Rei é marca de colégio recorrente no Brasil, daí a suspeita de que o (mau) texto seja verde-amarelo…

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COM FAULKNER, HEMINGWAY E COLE PORTER

O roteirista, que quer escrever um livro, está entediado, e não é pra menos: tem um sogro rico que adora a América e detesta os franceses (em Paris, o idiota quer vinho da Califórnia!), uma noiva meio bobinha, uma sogra fútil (acha uma cadeira de 18 mil euros uma pechincha!) e ainda lhe surge pela frente um cara que coleciona clichês de psicologia (do tipo “nostalgia é negação do presente”) e se acha especialista em vinhos (“prefiro os amadeirados aos frutados”). É preciso fugir dessa gente e viver a Paris de verdade, com Fitzgerald, Faulkner, T. S. Elliot, Gertrude Stein, Cole Porter e, naturalmente, Hemingway. Isto é Meia-Noite em Paris, filme de Wood Allen.
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07Minuit à ParisAllen também é “refugiado” na Europa

Nessa fuga, o roteirista encontra toda essa gente, acompanha seus dramas e contradições e, para completar, ainda se envolve numa paixão nova e sob medida, uma linda mulher, que “compreende” a literatura dele. É uma fantasia e uma homenagem à Paris da paixão de Allen (e da minha), um “refúgio” contra a mesmice do mundo em que vivemos. O filme tem forte relação de parentesco com A rosa púrpura do Cairo, de 1985, pelo mesmo viés de realismo fantástico. Há de se perceber ainda, além da homenagem, um quê de autobiográfico: Allen, qual seu personagem, foi recentemente “refugiado” na Europa, onde obteve financiamento para seus filmes, o que não conseguia nos States.

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Torre Eiffel com som de jazz antigo

Meia-Noite em Paris é uma delícia. Classificado como comédia romântica, o filme não me fez mais sorrir do que pensar. A história do roteirista americano de férias em Paris com a noiva e os sogros, quer morar lá e escrever um romance é motivo para mostrar a cidade e citar grandes mestres (em literatura, pintura, cinema e música) que ali foram abrigados. Paris é uma festa, de Ernest Hemingway, nos salta aos olhos. Meia-Noite… é essa celebração, abrindo com um clipe, som de jazz das antigas – Si tu vois ma mère, de Sidney Bechet (1897-1959), num city tour, em que quem conhece a cidade mais bela do mundo identifica locais famosos, a partir da Torre Eiffel.

(O.C.)

9 respostas

  1. Oia OC, vou ser sincero, não gosto muito dos seus textos, acho-os acadêmicos demais pra mim, mas esse de hoje é de lascar, principalmente o pedacinho abaixo:

    “Para todos os que tenham filhos e não sabem”

    “uma boa ocasião para se livrar das coisas inúteis que há na sua casa. Tragam os seus maridos”

    kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

  2. Excelente, como sempre, querido amigo escritor!
    Amei a forma sui generis de argumentor seus protestos.
    O vídeo musical, excelente!
    Também aceite meus protestos de elevada estima e alta consideração… só pra lhe azucrinar.

  3. Zelão diz: – PROTESTO ACEITO!

    A você nobre cidadão que cumpriu com a sua missão, ao protestar no mais elevado nível de educação, sem palavrão, deu à muitos dos seus concidadãos, uma nobre e educativa lição.

  4. Texto perfeito. É preciso realmente ir muito mais além dos centavos. Temos que protestar ainda pela isenção de impostos nas editoras -assim o livro seria mais barato-, protestar contra mercadorias expostas no chão das feiras livres, das placas de anúncios com erros de português, das obras mal feitas com dinheiro público, dos contratos com artistas de gosto duvidoso em festas públicas, protestar muito mais ainda para que todos saibam o que é realmente um país laico.
    Quanto à Paris dos sonhos não esqueçamos também de Nina Simone, Charles Aznavour, Gilles Lipovetsky, le cartier marais …
    Parabéns, é sempre um orgasmo ler Ousarme.

  5. Perfeito!
    Você, como sempre, inteligente, lúcido e instigante.
    Concordo plenamente com os seus “protestos”. Considero-os, com a sua licença, meus também.

  6. Falou em Jazz eu comento rss, na ultima vez que eu comentei nesse blog foi em alguma citação sua sobre algum album do Monk ou talvez do Miles, ja faz um bom tempo. Mas dessa vez você acertou em cheio, Paris, Woody e Jazz. É uma das poucas cidades do mundo que ainda respira jazz, até mais que Downtown em NYC. Mas sempre foi assim, desde o começo do bebop e seus consagrados musicos preferiam europa do que tocar nos States. “Meia-Noite em Paris” é de longe um dos melhores trabalhos de Woody, eu estava ouvindo uma entrevista de Tarantino em uma radio a alguns meses atras e ele descreveu de forma eficaz a grandiosidade do roteiro desse filme, que até o momento ja tinha assistido 5 vezes. De fato é um grande filme, com uma grande trilha sonora, é uma celebração da vida e dos sonhos. Bom texto. Keep Real! =)

  7. Sinto, depois de longa ausência, a necessidade de “comentar os comentários”, como fiz
    em outras épocas, nem que seja para dizer “obrigado a todos”. Não devo empregar a palavra “generosidade”, embora desejasse fazê-lo. É que estes tempos modernos parecem haver criado nas pessoas uma (quase) excessiva franqueza, levando-as a se despir da hipocrisia que é usada em sociedade. Comentários em blogs (quase sempre sob pseudônimos) são feitos sem luvas de pelica, às vezes com aguilhões, espinhos e vitríolo, por isso eu os vejo como coisa séria, franca, espontânea. A internet acabou com a generosidade, nestes casos? Sim ou não, é bom o que está acontecendo.
    Anotei que um leitor considera meus textos “acadêmicos demais”, outros me enviam “protestos de estima e consideração” (num trocadilho evidente com meus “protestos”), não faltou quem dissesse que este colunista “cumpriu sua missão, ao protestar com educação…”, a leitora “Lúcia Menezes” fez um texto político (querendo mais protestos, agora na área das artes) e ainda conseguiu me surpreender ao citar, entre os franceses de sua admiração, o filósofo Gilles Lipovetsky, grande teórico da chamada hipermodernidade, autor de uma montanha de livros. Se eu não prezasse este Universo P. por outros motivos, ter encontrado alguém que conhece Lipovetsky já seria suficiente. Só por tais “descobertas” já vale trabalhar.
    De “Gustavo Marques”, que entende de jazz e adjacências, foi ótimo ter a aprovação das referências que, modestamente, fiz. E seu aval a Paris, o filme e Wood Allen me envaidecem. Também acho que a soma jazz+Paris, feita por um diretor genial, “é uma celebração da vida e dos sonhos”.
    E, para variar, muito obrigado a todos.

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