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Geraldo MeirelesGeraldo Meireles

Do nosso lado ficaram apenas os mais pobres, os mais conscientes, os mais sonhadores e os mais teimosos. Não foi o Aécio quem perdeu a eleição, foram os brasileiros que venceram.

“Não troco ofensas com ninguém, mas discuto ideias com todos”, disse um tempo atrás a alguém no Face que não estava preparado para uma conversa civilizada sobre política.
Passados os momentos de emoção da disputa eleitoral, quero registrar o que vi de mais importante durante os embates da campanha, porque as lições foram tão preciosas que não merecem cair no esquecimento depois da vitória.
Em primeiro lugar, vi a desconstrução da imagem da “presidenta” e do PT ser iniciada e patrocinada pela grande mídia e pelos demais partidos opositores com as manifestações de junho/2013.
O Brasil tornou-se um palco de guerras urbanas, sem controle e sem sentido, em que os patrimônios público e privado ficaram à mercê de “manifestantes” financiados por interesses escusos, posteriormente revelados por causa da morte de um cinegrafista da Band e acalmados pelo pacto de paz com a visita do Papa Francisco. Por conta disso, vi um bando de “coxinhas” vaiarem a maior autoridade do nosso país diante do mundo, ofendendo-a com palavras e gestos impublicáveis, talvez comuns em suas mesas de jantar e convívio familiar, mas ofensivos às demais famílias brasileiras. Ainda bem que a fraca seleção do Felipão venceu a Copa das Confederações, caso contrário a Dilma e o PT seriam culpados.
Vi o grito de que “não vai ter Copa” tomar as ruas, os “analistas midiáticos” e os políticos de ocasião decretarem que o Brasil passaria vergonha na Copa, porque nada funcionaria, as obras de mobilidade urbana inacabadas seriam um obstáculo intransponível ao acesso dos torcedores, os aeroportos travariam, os estádios não ficariam prontos, a internet não atenderia às exigências da mídia estrangeira. A única coisa que eles apontavam como pronta e inatacável era a seleção do da Felipão, já que Dilma não era a treinadora.
Atendendo o clamor das ruas, num clima de forte comoção, vi políticos envolvidos no chamado “mensalão do PT” (registre-se nem todos eram do PT) serem julgados, presos, ridicularizados e expostos como troféu anticorrupção. Enfim, vi o fim da era PT profetizado por aqueles que não suportavam a simples menção dos nomes do Lula e da Dilma.
Para contra-atacar, a Dilma lançou mais programas sociais, anunciou o “Mais Médicos” priorizando a entrada de médicos brasileiros no programa e, depois, estrangeiros de várias nacionalidades, inclusive cubanos. Incrementou mais recursos para o “Minha Casa Minha Vida” e sentenciou que teríamos a “Copa das Copas” – o que foi comprovado por toda imprensa estrangeira, pela FIFA e pela grande mídia do nosso país que destinou todos os créditos ao povo brasileiro, ignorando as ações do governo. Aliás, para uma parte da mídia, o PT já havia comprado a Copa e o Brasil seria, inexoravelmente, campeão.
Vi a “Máfia do Jaleco Branco” mobilizada numa campanha “nunca vista antes na história deste país”, cuja palavra de ordem era “Fora Dilma e leve o PT junto”. Para eles, pobre tinha que morrer sem assistência médica básica, porque quando a Atenção Básica funcionar adequadamente, seus Planos de Saúde, suas clínicas e seus hospitais terão menos lucro.
Vi o Brasil entrar dividido num processo eleitoral, de um lado aqueles que representavam o mercado, a grande mídia e o projeto de estado mínimo que, anos atrás, havia colocado o país de joelhos diante do mundo; do outro lado, o PT odiado, estigmatizado como partido da corrupção, ferido mortalmente em seus alicerces e os aliados que lhe restaram. No meio disso tudo, vi surgir uma terceira via, uma alternativa de escolha para quem não queria retornar ao passado sombrio e havia perdido a confiança no PT. Só que essas duas alternativas ao PT não demonstravam viabilidade eleitoral, porque o que restava do PT ainda era consistente, o povo não abriria mão de suas conquistas por causa de promessas sem garantia.

Então, vi o imponderável entrar na história através de um “acidente” aéreo que mudou completamente a corrida eleitoral.
Daquele caixão, vi nascer uma candidata com força eleitoral, origem nas lutas sociais e história de vida que inflamava o eleitorado. Contudo, ela não podia ser ela mesma, porque a sorte tinha-lhe reservado apenas um papel de representação numa história que já estava escrita. A única coisa que era dela era o seu jeito simples de ser e rebuscado de falar. Enfim, nascera de um caixão, vivia de um fantasma e defendia confissões negadas por sua história. Insistentemente falava em derramar “vinho novo em odres velhos”, creio que nem ela mesma acreditava nisso, era só marketing e jogo de palavras – o que foi logo detectado pelos eleitores que a rejeitaram de forma peremptória e irreversível. Sua única contribuição para o processo eleitoral terminou sendo ressuscitar aquele que sempre esteve do outro lado da vida em toda a sua história. Talvez, por “nanicar-se” dessa forma, retorne na próxima eleição como os nanicos de todas as campanhas.
Vi, então, os gritos da rua sem qualquer representação nova, porque o velho e repudiado jeito de governar renasceu com força, agressividade e possibilidade de vitória.
Vi amizades sendo rompidas, pessoas sendo rotuladas e rejeitadas pelo exercício da livre manifestação de escolha (fui vítima algumas vezes), a intolerância virtual aproximando diferentes e separando iguais.
Vi, de forma triste, sacerdotes midiáticos apóstatas prometendo o que não possuíam, arrogando-se em profetas de uma geração que nunca os reconheceram assim, simplesmente porque profanavam o sagrado quando, por intenções nada santas, insistiam em sacralizar o profano, endeusando ou satanizando partidos ou candidatos. Se profetas fossem, profetizariam verdades. Creio que receberão sua parte naquilo que os espera.
Foram dias de debates intensos e, algumas vezes, até me questionava nesses embates e me afastava um pouco do front de luta para não escandalizar os mais fracos. Afinal de contas, antes de ser militante político, sou cristão.
Vi, enfim, o projeto político que eu acreditava vencer todos os adversários juntos, a xenofobia, o preconceito, a injustiça social, o capitalismo religioso, a grande mídia, a mentira, o cinismo, o ódio, enfim, tudo aquilo que nos escravizava e nos tornava gado. Do nosso lado ficaram apenas os mais pobres, os mais conscientes, os mais sonhadores e os mais teimosos. Não foi o Aécio, representante dos “tucanalhas” (perdoem-me, mas fui chamado de “petralha”), quem perdeu a eleição, foram os brasileiros que venceram.
Vejo agora todos buscando uma explicação como se uma sentença simplista pudesse demonstrar o reconhecimento de quem não era ninguém e se tornou alguém com direito a casa, comida, trabalho, educação técnica e superior pra si e seus filhos, acesso a saúde e cidadania. Como explicar as mudanças sociais resultantes das grandes obras publicas concluídas e em conclusão? Como explicar o prazer do sonho daqueles que viviam resignados?
Sabe por que o PT mais uma vez venceu? Porque “sim”!
“Beijinho no ombro” e Paz do Senhor a todos!
Geraldo Meireles é economista e servidor federal.

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