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Índio é absolvido em júri simulado||Foto Humberto Filho

No dia seguinte ao 19 de abril – data em que é celebrado o Dia do Índio – o tupinambá Cabloco Marcelino foi julgado e absolvido de todas as acusações na terceira edição do Júri Popular simulado promovido pela Defensoria Pública da Bahia (DPE-BA). O júri popular ocorreu na noite de sexta-feira, 20, no Teatro Tenda Popular, em Ilhéus. O evento foi acompanhado por 13 tribos indígenas, além de autoridades locais e estudantes da Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc).
A diretora da Escola Superior da DPE-BA, Firmiane Venâncio,afirma que a iniciativa ratifica a necessidade de respeito à real história dos personagens do Brasil. “Esse julgamento foi muito representativo, até porque o Brasil vive um problema que é a criminalização das lideranças dos povos indígenas, negros, dos movimentos sociais. É importante conhecer esses personagens para sabermos por que que a gente errou nesse ponto da história que vivemos hoje”, pontuou Firmiane.
 O JÚRI

“Meu nome é Marcelino José Alves, eu tenho a idade da história do meu povo, eu cuido da terra, eu trabalho na terra, a minha profissão é resistir”, respondeu o ator Pedro Albuquerque, do Teatro Popular de Ilhéus, durante a encenação, incorporando o personagem, em resposta ao juiz do Tribunal, interpretado pelo defensor público Leonardo Salles.

Incriminado pela acusação – interpretada pela defensora pública Aline Muller – por tentativa de homicídio de um tenente, roubo à mão armada, incitação ao ódio entre classes sociais, e atentado a pessoas e bens por motivos políticos; e taxado como assassino, subversivo, bandido e comunista pela mídia, Marcelino se defendeu com cabeça erguida e convicção de ideais.
“Nosso povo vive uma vida diferente, desde sempre eu aprendi a dividir de tudo, a terra não tem dono, a terra ancestral é de todos nós. Nós e aterra somos uma coisa só. A dor de um tupinambá é a luta de todos os tupinambás”, exclamou o índio personagem.
A defensora pública Júlia Baranski, que emanou o espírito da defensoria na encenação, ponderou no julgamento os direitos de terra dos povos originários e a legítima defesa frente aos ataques sofridos por conta de interesses de mercado. “As terras não foram doadas aos ancestrais de Marcelino por Dom João VI, mas tomadas pela coroa portuguesa quando aportaram no Brasil em 1500”, interpretou Baranski. A defesa ainda destacou a importância de ouvir o lado indígena da história, além de mostrar as perseguições do Estado com esse povo.
“Julgo improcedente a ação penal movida contra Marcelino José Alves, índio caboclo Marcelino, absolvendo-o de todos os crimes que lhe foram atribuídos na denúncia” – sentenciou o simbólico Egrégio Tribunal do Júri.
De acordo com o livro Índio na Visão dos Índios: Memória,  Caboclo Marcelino lutava pela recuperação de territórios indígenas invadidos, terras da antiga aldeia de Olivença. A obra afirma ainda que o índio foi perseguido  pela elite cacaueira e pela imprensa local, no período do Estado Novo.
RELEITURA
Promovendo uma releitura do Direito na História, o projeto foi idealizado pelo subdefensor público geral da Bahia, Rafson Ximenes; pela subcoordenadora da Especializada de Proteção aos Direitos Humanos, Eva Rodrigues; e pelo defensor público Raul Palmeira.
O Júri garante o resgate dos direitos de personagens históricos que, à época, não puderam exercer com plenitude a garantia do contraditório e da ampla defesa efetiva. Em edições anteriores a Defensoria baiana realizou o julgamento, com absolvição das acusações passadas, de Luíza Mahin e Zumbi dos Palmares.

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