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Sônia CoutinhoA escritora e jornalista itabunense Sônia Coutinho, de 74 anos, morreu na noite de sábado, 24, no Rio de Janeiro, em decorrência de parada cardíaca.  Filha do político e escritor Nathan Coutinho (como presidente da Assembleia Legislativa, chegou a assumir o governo baiano no período Antônio Balbino) e irmã do filósofo Carlos Nelson Coutinho (um dos fundadores do PT), Sônia Coutinho foi destaque nas letras brasileiras.

Publicou seu primeiro livro, O herói inútil, em 1964, tendo recebido o Prêmio Jabuti em duas ocasiões: em 1979, pelo conto Os venenos de Lucrécia, e em 1999, pelo livro Os seios de Pandora.

Além desses prêmios,  ela recebeu, em 2006, o Clarice Lispector, da Biblioteca Nacional, pelo livro de contos Ovelha negra e amiga loura. Outros livros de destaque de sua autoria são Uma certa felicidade, Mil olhos de uma rosa, O caso Alice e O jogo de Ifá. Conhecida fora do Brasil, a escritora teve livros publicados nos Estados Unidos, França e Alemanha.

Sônia Coutinho, que deixa uma filha e dois netos, foi casada com três escritores do Sul da Bahia (pela ordem): Hélio Pólvora, Florisvaldo Matos e Marcos Santarrita. Membro da Academia de Letras de Itabuna, ela morreu sem tomar posse.

O corpo da escritora foi velado na Capela 9 do Cemitério São João Batista e será cremado nesta segunda, 26, às 11h, no Cemitério do Caju, no Rio de Janeiro.

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SE POSSÍVEL, TRADUZA OS NOMES PRÓPRIOS

Ousarme Citoaian | ousarmecitoaian@yahoo.com.br

Acabo de revisar as memórias de competente professor (aposentado), em que troquei o nome Michelangelo por Miguel Ângelo. É provável que o autor não concorde (revisores têm poder de sugerir, não de mudar o texto) e mantenha a forma italiana, um erro evidente, pois nomes próprios, quando isto é possível, devem ser traduzidos. Se perguntarmos a qualquer pessoa, mesmo pouquíssimo letrada, o nome de um rei da França ela dirá um Luís qualquer (eles foram tantos!), talvez aquele que inventou o salto de sapato Luís XV; se inquirirmos sobre a rainha que teve o lindo pescoço cortado, ouviremos: Maria Antonieta. “Qualquer pessoa” está certo.

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A dama das camélias e os mosqueteiros

Seria muito pernosticismo alguém no Brasil chamar a dupla de reis decapitados de Louis XVI (algo como luí dissiziême) e Marie-Antoinette (marri antoanéte, para os menos avisados) – um “francesismo” evidentemente dispensável. Ainda nesta linha, Alexandre Dumas (fils) passou a Alexandre Dumas Filho, enquanto son père é apenas Alexandre Dumas. O pai escreveu Os três mosqueteiros e o filho criou A dama das camélias, título que (nunca em público) dou a famoso colunista social de Itabuna. Por fim, uma gracinha com mais de um século de idade: os três mosqueteiros eram quatro! E dizer que Luís XV inventou o salto alto foi só uma boutade…

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Os dicionários não registram “boutade”

A gentil leitora e o paciente leitor, se, por acaso, não sabem o que é boutade, não percam tempo com dicionários, pois eles (os dois que possuo, pelo menos) não registram o termo, embora seja o mesmo de uso corrente em língua portuguesa há muitos anos. Mas eu explico, à maneira de Freud: trata-se de dito espirituoso, brincadeira verbal, gracejo – e, de acordo com o professor (também romancista, cronista, contista, da Academia Brasileira de Filologia, autor de Orelhas de aluguel e vários outros títulos) Deonísio da Silva, vem do verbo francês bouter, empurrar, ora veja.  Sobre o sapato Luís XV e os Dumas, depois eu conto.

ALÉM DE DESATENTO, ANALFABETO EM POESIA

Já disseram que eu sofro de uma tal “síndrome da falta de atenção” (SFA). Maldade, só porque às vezes esqueço onde deixo o carro, noutras tento abrir o carro alheio (até abri alguns, mas, felizmente, ninguém viu), chego a entrar, por engano, no apartamento do vizinho – essas bobagens. Mas cometi um exagero de SFA, aqui, há dias: atribuí a Geir Campos um verso de Vinícius de Morais, propiciando a oportunidade de ser visto como, além de desatento, analfabeto em poesia (aliás, um leitor teve a bondade de lembrar que, num livro, citei Lolita como de Pasternak, quando é de Nabokov – e isto foi em 2006, o que mostra ser antiga essa “doença”).  Se fumasse, seria capaz de jogar o cigarro na cama e me deitar no cinzeiro.

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A vagareza dos minutos adoça o outono

Li muito Geir Campos na juventude. Participante da luta política, comunista, ele integrou a Geração de 45, então dizer que era engajado é beirar o pleonasmo. No lendário I. M. E. de Ilhéus, pus no mural do grêmio um poema dele que começava assim: “Aos que acreditam em metempsicose e outras formas de imortalidade da alma…” – por pouco não fui expulso, devido à “ofensa”. Em Alba, outro exemplo da força revolucionária que Geir imprimiu à sua poética: “Não faz mal que amanheça devagar,/ as flores não têm pressa, nem os frutos:/ sabem que a vagareza dos minutos/ adoça mais o outono por chegar./ Portanto não faz mal que devagar/ o dia vença a noite em seus redutos/ de leste – o que nos cabe é ter enxutos/ os olhos e a intenção de madrugar”.

JORGE AMADO E OS NÃO LEMBRADOS EM 2012

O centenário de Jorge Amado foi festejado na Bahia inteira (até nesta modesta coluna), o que contribuiu para o esquecimento de outros nomes. Fernando Leite Mendes (nascido em 1932) teria agora 80 anos, idade “redonda”, boa para ser comemorada; Os sertões, livro fundador do Brasil do lado de cá, parece esquecido (junto com Euclides da Cunha), nos seus 110 anos – foi lançado em 1902. Já o professor, jornalista, cronista e sonetista parnasiano, Plínio de Almeida, educador de gerações (que completaria 108 anos em setembro), ganhou da Academia de Letras de Itabuna – Alita um concorrido recital de poesia em praça pública. Ainda bem.

FERNANDO LEITE MENDES, 80 ANOS

Fernando Leite Mendes era advogado, mas sua maior atuação se deu na imprensa. Trabalhou em grandes veículos do Rio, a exemplo de Última Hora, Correio da Manhã e Diário de Notícias, e produziu crônicas de intenso lirismo. Livro, apenas um, publicado post mortem: Os olhos azuis de dona Alina e algumas crônicas. Com dona Alina, que dirigiu a Escola Afonso de Carvalho (ao lado do Palácio Paranaguá), FLM aprendeu a ler. Generoso, deixou imortalizados em Os olhos azuis… personagens ilustres de Ilhéus, como Otávio Moura, Carlos Pereira Filho, Demosthenes Berbert de Castro, Emo Duarte e, claro, dona Alina. O espaço acabou; FLM, não.

UM PARCO SABER “DE EXPERIÊNCIAS FEITO”

Dia desses, sem querer, entrei numa discussão, ao cunhar a frase “se ela [a memória] fosse boa não perdia palavras” – e alguém, com carradas de razões, informou ser perderia. O meu parco saber é “de experiências feito”, na expressão de Camões (valho-me de leituras e exemplos vividos, não da gramática, que desconheço). Mas deixemos claro que isto aqui não é defesa (nem acusado fui), mas somente combustível para nossas conversas semanais. Tanto que, de imediato, me pareceu, e ainda parece, que o “não perderia palavras” do leitor é a melhor escolha – embora ache defensável, para o caso, a forma coloquial que usei.

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Sem beliscões e sem “vossa excelência”

Tenho o hábito (vício, diriam) de misturar tempos de verbos, como forma “direta” de comunicação com o leitor. Se alguém tiver a bondade de me incluir em algum tipo de literatura, será na crônica – algo que fica a igual distância da prosa, da poesia e da conversa de bar. A crônica literária – se duvidam de mim, creiam em Fernando Sabino, Rubem Braga e Hélio Pólvora, para citar poucos entre os grandes – não é o locus das formas “pesadas” do estilo. Cronista não dá beliscões no bumbum da gramática, mas também não a trata por “vossa excelência”. Na semana passada, escrevi aqui “nunca ia saber…” e, felizmente, passei despercebido. Não acho grave, mas a discussão está aberta.

De Garcia Márquez a Monsueto Menezes

“Muitos anos depois, diante do pelotão de fuzilamento, o Coronel Aureliano Buendía havia de recordar aquela tarde remota em que seu pai o levou para conhecer o gelo”. É a abertura de Cem anos de solidão, que todos conhecem. Eric Nepomuceno, o tradutor brasileiro, quis trocar havia por haveria, mas Garcia Márquez insistiu no “erro”. Sílvio Alexandre e Ednei Procópio, especialistas em literatura fantástica (em comentário à abertura de Cem anos…), grafam “haveria de recordar”, à revelia do autor, já se vê. Mais perto de minha “cultura” ficou o gramático Monsueto, em Me deixa em paz (acho que armei esse fuzuê todo para justificar a presença na coluna da excelente e esquecida Alaíde Costa).

(O.C.)

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Ao “comentar os comentários” feitos à coluna Universo Paralelo, que assina aqui no Pimenta, Ousarme Citoaian teve uma surpresa: “O guriatã existe!” – exclamou, feliz feito um índio de Gonçalves Dias, ao ler a informação de um leitor. O colunista se referira ao pássaro símbolo da Academia de Letras de Itabuna, como “talvez já extinto”. Bichinhos de pena à parte, O. C. ainda conversa sobre poetas, poetos, poetisas e jazz (uma de suas paixões assumidas). Depois de rápido passeio (de nariz tapado!) pelo rock dito “brasileiro”, visita a língua portuguesa, tangencia a “sincronicidade” de Jung e, diante de certo comentário, se rende: “Não me sinto hipócrita bastante para não sentir o ego acariciado”.

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HÍFEN É PUNIÇÃO CRUEL PARA A INOCÊNCIA

Ousarme Citoaian | ousarmecitoaian@yahoo.com.br

Já citei Dad Squarisi e o “castigo divino” que Deus lançou sobre as línguas como punição aos homens por causa da Torre de Babel: o francês ficou com uma carga de acentos, o inglês escreve de um jeito e pronuncia de outro (exemplo: a pronúncia de here, é ria!), o alemão emenda as palavras, e nós de língua portuguesa fomos punidos com o hífen. Por isso eu digo que hífen não é sinal de escrita, é cruel punição para a inocência. As coisas estavam nesse eterno “tem hífen, não tem hífen”, quando veio o Acordo Ortográfico de 2009 e embananou tudo de uma vez por todas. Na semana passada, por imposição da regra, escrevi aqui “dor de cotovelo” (assim, sem hífen), sob protesto.

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Fica complicado o que nunca foi simples

Antes do Acordo, a regra era clara. Quando dois termos se unem e perdem o sentido, mete-se entre eles um tracinho ou dois e pronto. Assim, pé de moleque é o pé do moleque, enquanto pé-de-moleque é um doce; mesa redonda é uma mesa redonda (óbvio), mesa-redonda é uma negociação, uma discussão. Seguindo esse princípio, dor de cotovelo não é o que eu quis dizer (disse-o sob pressão, pois assim mandou o livro consultado). Qualquer pessoa escolarizada sabe que dor-de-cotovelo resulta de saudades e amores descarrilhados, não de bater os braços por aí. Mas parece que estamos condenados a essa barafunda hifeniana oficializada pelo Acordo, que veio complicar o que nunca foi simples.

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O GURIATÃ NOS UMBRAIS DA IMORTALIDADE

A Academia de Letras de Itabuna (Alita) tem entre seus símbolos um simpático pássaro outrora popular na região, hoje talvez já extinto, o guriatã. Minha surpresa foi descobrir desse bichinho uma descrição feita por um certo padre Jácome Monteiro, em 1610, há, portanto, mais de 400 anos: “É pássaro pequeno, do tamanho de um pintassilgo, preto pelas costas e por baixo amarelo, com um barrete da mesma cor, que o faz mui gracioso. É o pássaro mais músico de quantos há nesta Província, porque arremeda a todos os mais, e por isso o chamaram guiranheenguetá, que quer dizer pássaro que fala todas as línguas de todos os mais pássaros. São mui prezados. Estes são os que de ordinário se conservam cá em gaiolas”. Ao guriatã, agora imortal da Alita, mais quatro séculos de vida.

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DE ITALIANO SÓ SEI UMA PALAVRA: “PIZZA”

O Brasil ainda discute se dona Dilma é presidente ou presidenta – e os saudosistas não a aceitam, seja no masculino, no feminino, no neutro ou pintada de ouro sob pedrinhas de brilhantes (mas esta é outra história). Eu sempre tratei mulher no feminino: vereadora, professora, parenta, reitora – e por aí vai. Presidenta, então. A palavra existe nas línguas irmãs francês e espanhol (em italiano, desconheço, pois na língua de Dante eu só sei dizer pizza – e outra coisa que não pode ser escrita em blog familiar). Sthendal (O vermelho e o negro), Ariano Suassuna (O romance d´A pedra do Reino) usaram presidenta . O lusitano Antônio Feliciano de Castilho, também. Mas nosso tema é poeta/poetisa.

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Finalmente, mulher é poeta ou poetisa?

A história fala de uma poetisa chamada Safo, da ilha de Lesbos, na Grécia do século VII a. C. Nas últimas décadas, o Brasil passou a chamar as mulheres de poetas, transformando o que era feminino em “comum de dois”. Para os defensores de “novidades” na língua portuguesa, quem escreve “poesia de verdade” é poeta, não importa se homem, mulher ou qualquer outro sexo desses que por aí abundam. Poetisas seriam as senhoras e moçoilas que recitam seus versos bisonhos em modorrentas tardes de saraus, rimando mão com coração, ou não rimando nada com nada. Poeta escreve poesia, poetisa escreve asneiras – parece ser a regra que fixaram. Besteira pura, acho eu.

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Poetisas são “promovidas” a poeta?

Creio que em poeta/poetisa temos a sombra do preconceito: é de homem o ato de escrever poesia, de sorte que a boa poetisa tem direito ao título masculino de poeta, e a má poetisa que fique em sua primitiva condição feminina. Entendo que há bons e maus poetas, boas e más poetisas. Mas é só minha opinião. De Janete Badaró, ao entrar para a Academia de Letras de Ilhéus, Francolino Neto disse que deixou de ser poetisa, passou a poeta. Foi “promovida”, a meu ver, uma ofensa – mas o que fazer, se as próprias mulheres gostam desse jogo? Disse Cecília Meireles (foto), num poema: “Não sou alegre nem sou triste: sou poeta”. Nunca soube se Valdelice Pinheiro se achava poeta ou poetisa. Eu a chamo poetisa. E das grandes.

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A PEDRADA INADMISSÍVEL QUE NINGUÉM VIU

Tive um professor meio descuidado que, como é comum aos descuidados, volta e meia errava, falando ou escrevendo. Se, com todo respeito, lhe apontávamos o deslize, ele dava sempre a mesma explicação: errara de propósito, para verificar se seus alunos estavam atentos… Na semana passada, ao falar de “duas coisinhas”, grafei, numa pedrada homérica, “duas cozinhas”. Poderia dar várias “razões” para o episódio, mas seriam todas falsas. Foi erro mesmo (que não recebeu, estranhamente, nenhum comentário). Não há justificativa mas desculpas.

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DAVIS: DROGAS, ARROGÂNCIA, GENIALIDADE

Mesmo quem não é muito ligado ao jazz, a melhor coisa do mundo, depois do uísque com água de coco (melhor ainda os dois, de braços dados), conhece o som do trompete de Louis Armstrong (foto), por ser único. Creio que é único também o trompete de Miles Davis (Chet Baker é acusado de imitá-lo). Miles Davis, o divino, é um dos meus músicos preferidos – nunca tomei conhecimento de suas experiências inovadoras do rock (um filho espúrio do jazz), mas ele é tido como essencial aos dois gêneros. Tirânico, arrogante, autodestrutivo e com indisfarçável ódio pelos brancos, Davis era um gênio que não teria lugar neste século. Não por acaso, morreu em 1991, aos 64 anos, depois de muita confusão, drogas e influência sobre imenso número de músicos.

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Sopro particularíssimo do divino Davis

Aqui, Miles Davis mostra sua leitura de Summertime, um tema de jazz que já teve todo tipo de interpretação (Armstrong, Janis Joplin, Billie Holiday, Ella Fitzgerald, Frank Sinatra, Norah Jones, Charlie Parker, Sarah Vaughan, para citar uns poucos). A meu juízo de ouvinte não técnico, este bem-comportado registro não faz nenhuma revolução no jazz (que o músico californiano costumava incendiar). Mas é uma oportunidade, para quem não é do ramo, de tomar conhecimento do sopro particularíssimo de Miles Davis, a cujo nome costuma seguir o epíteto “o divino”.

(O.C.)