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marivalguedesMarival Guedes | marivalguedes@gmail.com

Na verdade Imperial fez o jogo sujo a serviço de Daniel Filho, diretor da Globo, numa vingança provocada por uma profunda dor de corno. Mário Gomes trabalhava numa novela e estava namorando a colega Betty Faria, mulher do poderoso diretor da emissora.

Você já foi vítima de fofoca ou calúnia? Estas maldades podem partir da vizinhança, trabalho, escola, igreja, partido ou do barzinho. Algumas vezes a mídia noticia sem antes investigar a denúncia, manchando a vida das pessoas caluniadas.

O casal Glória Pires e Orlando Morais já foi atingido. Uma nota num jornal acusava o músico de traição com a enteada, Cléo Pires, filha da atriz e de Fábio Júnior. Acrescentava que o episódio levou Glória à tentativa de suicídio.

Dizia também que, no contrato entre a Globo e Glória Pires, havia uma cláusula exigindo que Orlando Morais fosse autor de músicas nas trilhas sonoras das novelas que ela participasse.

A fofoca atingiu duramente a família, provocando hipertensão em Orlando. De onde partiu, não souberam. Mas entraram com ações na justiça contra os veículos que divulgaram. O drama é relatado num capítulo da biografia “40 anos de Glória”.

Outra bomba detonou a Escola Base em SP. O casal de proprietários foi acusado de abusar sexualmente de duas crianças. Divulgada pela Rede Globo sem a devida apuração, foi replicada por vários veículos.

A história foi desmentida, os órgãos de comunicação se retrataram, o casal entrou com ações na justiça. Mas o estrago já estava feito: escola fechada, dívidas, problemas morais e psicológicos.

O ator Mário Gomes também foi vítima. Uma nota afirmando que ele foi hospitalizado com uma cenoura no ânus repercutiu nacionalmente. Encaminhada pelo jornalista e produtor musical Carlos Imperial, a baixaria foi publicada no jornal Luta Democrática.

Afirmava o texto: “O másculo galã deu entrada na Maternidade Fernando de Magalhães para medicar-se de uma insólita ocorrência. Ele estava entalado com uma cenoura em local absolutamente sensível…”

Na verdade Imperial fez o jogo sujo a serviço de Daniel Filho, diretor da Globo, numa vingança provocada por uma profunda dor de corno. Mário Gomes trabalhava numa novela e estava namorando a colega Betty Faria, mulher do poderoso diretor da emissora.

O ator diz que “a nota foi uma cilada plantada por vingança porque eu e Betty Faria nos apaixonamos”. Ele compara a calúnia a “uma tentativa de assassinato”, lembrando que foi estigmatizado, apontado nas ruas e ficou longe das telas por longo tempo.

Marival Guedes é jornalista e escreve no Pimenta às sextas.

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MC DONALD´S COMO SÍMBOLO DA DECADÊNCIA

Ousarme Citoaian
Em viagem recente, conversei com uma senhora parisiense sobre a decadência da cultura francesa, que influenciou o Brasil e o mundo (até o início do século XX, pelo menos). Acordamos em que o espaço da língua culta foi muito reduzido – salvo na área diplomática, em que ainda é exigida. Mas tínhamos preocupações diferentes: eu, perfunctório, o geral (língua, música, cinema, literatura); ela, de olhar profundo, incluía a mesa. Enquanto eu lamento que já pouco se estude francês (língua “irmã” do português) ou se ouçam canções francesas, a gentil senhora deplorava a presença do Mc Donald´s a popularizar hambúrgueres malcheirosos – uma agressão à cuisine (pouco importa se nouvelle ou classique). É a obesidade chegando.

AO LADO DE ROBESPIERRE, MARAT E DANTON

Sou dos tempos em que Hugo, Flaubert, La Fontaine e Voltaire eram traduzidos na escola. Cantava-se, mesmo desafinado, La marseilleise (lá fui pescar este grito de Aux armes, citoyens!), ouvia-se Bécaud, Piaf, Aznavour, Mireille Mathieu,Yves Montand e Juliette Gréco. No cinema, Alain Resnais, Clouzot, Simone Signoret, Alain Delon, Louis Malle, Charles Vanel e Anouk  Aimée-Jean-Louis Trintignant (na foto). Certo menino, durante a aula de história, muitas vezes atravessou a velha Paris do fim do século XVIII em companhia de Robespierre, Danton e Marat. Derrubei bastilhas e monarquias, nenhuma piedade pelas cabeças coroadas que rolavam. Na França ensanguentada, imaginei a reação no meu País – e ainda imagino: às urnas, cidadãos!

O NOVO SEMPRE VEM, QUEIRAMOS OU NÃO

As coisas mudam, o novo sempre vem. Mas nem todo velho é ruim, nem todo novo é bom, nem tudo que parece novo é novo. Com a companheira de viagem fiz apreensões da realidade e externei preocupações com a expansão do império norte-americano – entendendo que tal império outrora foi francês, e que La mère África sofre com isso até hoje. C´est la vie, dissemos em coro. E, para comemorar, comemos talvez nossa última refeição ritual: um pavê de morue à l´huile d´olive, et ratatouille, que vem a ser (se acaso o vinho e aqueles olhos insondáveis não me embotaram a memória) um lombo de bacalhau nadando em azeite, cercado de legumes por todos os lados, menos o de cima. Não era uma sessão de saudosismo. Se saudade tive foi do menino que já teima em não mais habitar em mim.

COISA É MACONHA E MUITAS OUTRAS COISAS

Circulam na internet curiosidades sobre a palavra “coisa”, entre elas que pode ser substantivo, adjetivo, advérbio e, como derivado, o verbo “coisar” – usado em substituição a verbo esquecido. No Nordeste (e em Portugal) significa praticar o ato sexual, enquanto “coisas” seriam os órgãos genitais. Tirem as crianças da sala que lá vai José Lins do Rego, num trechinho didático de Riacho doce: “E deixava-se possuir pelo amante, que lhe beijava os pés, as coisas, os seios”. Fred Navarro (Dicionário do Nordeste) informa que, na região, “coisa” é um dos nomes da maconha, hoje coisa de passeata. O abono vem de um time que sabe das coisas: Bráulio Tavares, Zé Vicente da Paraíba e Passarinho do Norte, num martelo agalopado.

“VIAGEM” COM SUOR, VERTIGEM E FRAQUEZA

“Tem um verso que fala da maconha/Uma erva que dá no meio do mato/Se fumada provoca o tal barato/A maior emoção que a gente sonha/A viagem às vezes é medonha/Dá suor, dá vertigem, dá fraqueza/Porém quase sempre é uma beleza/Eu por mim experimento todo dia/Se tivesse um agora eu bem queria/Pois a coisa é da santa natureza”. Pausa para dizer uma coisa: martelo agalopado é uma dentre as muitas modalidades da composição poética popular, conforme o modelo acima: dez versos de dez sílabas poéticas, com rimas do tipo ABBAACCDDC, isto é, o primeiro verso rima com o quarto e o quinto, o segundo com o terceiro, o sexto com o sétimo etc. Já se vê que produzir esse pacote de rimas de improviso não é coisa para amador.

CARNAVAL: SEGURA A COISA E A COISINHA!

Caetano Veloso usou a palavra em Qualquer coisa (“esse papo seu tá qualquer coisa” e em Sampa (“Alguma coisa acontece no meu coração”). Noel disse que o samba, a malandragem, a mulata e outras bossas “são coisas nossas”. O carnaval de Olinda tem o bloco adulto Segura a coisa (no estandarte, um baseado tamanho família) e o infantil Segura a coisinha. O grito de Alceu Valença ecoa pelas ladeiras seculares: “Segura a coisa, que eu estou chegando”. A MPB, às vezes, trata a coisa com certo exagero: Gonzaguinha fala em “coisinhas miúdas” e Jorge Aragão-Almir Guineto-Luís Carlos criaram a tatibitate “coisinha tão bonitinha do pai”, que virou trilha sonora da Nasa. Do maestro Moacir Santos (e seu Coisas) falaremos depois.

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FILME QUE NÃO CHEIRA A NOVELA DAS OITO

Sem esperar muito da Globo Filmes e suas produções com cheiro de novela das oito, fui ver Tempos de paz (Daniel Filho/2009) e tive uma surpresa agradável. É abril de 1945. Após muita tortura pelo Estado Novo de Getúlio Vargas, vários presos políticos ganham a liberdade, devido à pressão externa decorrente do fim da segunda guerra mundial. Um ex-torturador (Tony Ramos), agora chefe da seção de imigração na Alfândega do Rio de Janeiro, teme que suas vítimas resolvam se vingar. Em meio a essa paranóia, surge um imigrante polonês (Dan Stulbach) que se diz agricultor, mas tem mãos finas e recita Drummond (“Não serei o poeta de um mundo caduco”). Isto é muito suspeito.

ATORES VIVEM “DUELO” DE INTERPRETAÇÃO

O ex-torturador é chamado a investigar o caso, com poder de decidir se o polonês entra no Brasil. A alternativa é a volta, pelo mesmo navio em que chegara, e que já apita no cais, anunciando a saída. O fugitivo da Polônia tem contra ele, além da má vontade, o tempo. O que se vê aqui é uma espécie de duelo de interpretação de dois grandes artistas: Tony Ramos, consagrado pelo público, e Dan Stulbach, um bicho de teatro, com raras aparições na tevê. Depois de esgotar todos as justificativas para seu ingresso no Brasil, o polonês não dissipa as suspeitas do ex-policial. Este, como se espera, é um homem frio, capaz de contar detalhes do seu “trabalho”, sem mostrar emoção.

O TEATRO JAMAIS GANHOU HOMENAGEM MAIOR

E é em cima dessa frieza que o imigrante é chamado a defender sua permanência no Brasil ou ser repatriado (no porto, o navio apita mais uma vez).  Com um estranho senso de humor (talvez próprio dos torturadores), é proposto ao imigrante um desafio: se este contar algo que faça o agente chorar, poderá entrar no País; se não, embarcará no navio que zarpa em poucos minutos. É o ápice do filme. O polonês (que não é lavrador, mas ator) declama Monólogo de Segismundo – da peça A vida é sonho (Calderón de la Barca/1635). Tempos de paz é a maior homenagem que o teatro já recebeu do cinema.  Ah, sim. O torturador chorou – e eu também. Clique e veja que só o bom texto nos redime.

(O.C.)

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70 MM

duas estrelas

Leandro Afonso | www.ohomemsemnome.blogspot.com

Chico Xavier (idem – Brasil, 2010), de Daniel Filho (Se Eu Fosse Você 1 e 2, Primo Basílio), é menos um filme que um manifesto religioso institucional, é mais um ponto de partida sem desenvolvimento que um ponto de vista. É um filme que ou se sustenta no factual histórico, que faz questão de querer se auto-legitimar no fim, ou investe na defesa da fé. O porém, e aí talvez resida o maior problema dele, é que essa fé não é na ou da ficção – o que o filme é (por mais que baseado em fatos reais e com término institucional) –, mas na fé no e do personagem, com e de suas convicções.

Desde o começo, Daniel Filho demonstra o que pode ser visto como competência, mas essa competência vem muito mais da inevitável experiência adquirida após 40 anos de produção especialmente para a tv do que de um talento específico para fazer cinema. O melhor exemplo disso talvez seja a cena (entrecortada com flashbacks durante todo o filme) em que é reconstituído o programa Pinga Fogo, da TV Tupi, em famosa entrevista de Chico Xavier.

O ritmo é tão convincentemente televisivo – e consequentemente rápido – que a distração causada pelos cortes e movimentos se torna maior que a atenção dada à mensagem passada por Chico Xavier (Nelson Xavier). Se a tentativa foi dar força a Chico Xavier ou à reconfiguração histórica (até por vermos um ator reconhecido por todos, Tony Ramos), ela é falha; se foi reforçar a personalidade do ateu vilanístico da história, funcionou.

Mas, como em várias outras bioproduções com presunção essencialmente populista num tempo recente (talvez em toda a Retomada), de Pelé Eterno a Lula – O Filho do Brasil, aqui o personagem torna-se maior que o filme. Não bastasse os créditos finais acompanhados de imagens de arquivo reencenadas no filme, e o uso de toda a expressão caricatamente martirizável de Ângelo Antônio como o personagem, somos (re)lembrados da hora da morte de Chico Xavier, para chegar à conclusão de que toda a espiritualidade dele estava certa.

Não que haja problema em defender uma ideia religiosa – longe disso. O problema é que, no fim, a impressão é que esse caráter defensor da direção e do roteiro (de Marcos Bernstein, de Central do Brasil) não privilegiaram o que a ficção poderia dar de melhor, já que os principais acontecimentos da vida do personagem guiam o filme em piloto automático, sem quase nada além do óbvio. O poder de convencimento, que aqui podemos chamar até de mérito, está mais ligado à fé na doutrina do que na maneira como defende ela. O que, infelizmente, só ressalta a sensação de apatia que beira a preguiça.

Visto, em Cabine de Imprensa, no Multiplex Iguatemi – Salvador, março de 2010

Chico Xavier (idem – Brasil, 2010)

Direção: Daniel Filho

Elenco: Nelson Xavier, Ângelo Antônio, Matheus Costa, Tony Ramos, Christiane Torloni

Duração: 124 minutos

Projeção: 1.85:1

8mm

Soul Kitchen (2009), de Fatih Akin

Ainda que deixe um talvez demasiado gosto da decepção, Soul Kitchen (2009), de Fatih Akin, nos mostra uma Anna Bederke que, se tudo der errado, vai no mínimo sempre lembrar Anna Karina – musa de Godard e da Nouvelle Vague nos anos 60. E como adendo, além de a moça parecer mais alguém que não tenho certeza (acho que não é Uma Thurman), o que contribuiu para uma impressão promissora é que ela faz aqui apenas seu primeiro filme.

Filmes da semana

1. Ressaca de Amor (2008), de Nicholas Stoller (DVD) (***1/2)
2. O Filho da Noiva (2001), de Juan José Campanella (DVD) (***1/2)
3. Halloween 2 (2010), de Rob Zombie (Multiplex Iguatemi) (**1/2)
4. Chico Xavier (2010), de Daniel Filho (Multiplex Iguatemi – Cabine de Imprensa) (**)
5. Soul Kitchen (2009), de Fatih Akin (Cine Vivo) (**1/2)

6. Comédias e Provérbios: Pauline na Praia (1983), de Eric Rohmer (DVDRip) (****)
7. Noite Americana (1973), de François Truffaut (DVD) (****)

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Leandro Afonso é comunicólogo, blogueiro e diretor do documentário “Do goleiro ao ponta esquerda”.