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Como a jornalistas não é permitido exercitar a criatividade hermenêutica dos bacharéis concursados do Parquet, resta-nos a criatividade semântica a serviço da retórica e o “jus sperniandi”. Esperneemos, pois.

 

Ernesto Marques

Sempre me incomoda ler/ver/ouvir de colegas de imprensa equívocos como: o Ministério Público “determinou”, “decidiu”, “proibiu”…

Se a imprensa é mesmo o quarto poder, não atentou para os riscos de tais equívocos colaborarem para criar um quinto – nem sempre independente, mas sempre autônomo. As redações banalizaram o erro no qual reincidem focas, editores, comentaristas e medalhões do jornalismo brasileiro. Não se trata de mera questão semântica e este episódio do “embargo” ao cumprimento da decisão da Comissão Intergestora Bipartite (CIB), incluindo comunicadores entre os grupos prioritários para a vacinação, é só mais um sintoma do vírus do abuso do poder institucional que nós, jornalistas, ajudamos a instilar.

As aspas no termo “embargo” são propositais mesmo. O Ministério Público nada embarga. Não determina coisa alguma, a quem quer que seja. Nada decide, muito menos proíbe. O MP, no entanto, tem o poder de provocar quem, de fato e de direito, tem o poder de embargar, determinar ou mesmo proibir algo: a Justiça.

Do império até os estertores da ditadura militar, o MP não passava de mero apêndice mal resolvido, pendulando entre o Executivo e o Judiciário. Ganhou outro status com a Lei da Ação Civil Pública, de 1985. O então presidente Sarney vetou o artigo que dava ao MP o poder de atuar em defesa dos direitos difusos – conceito novo para o Brasil daquela época. Na conversa com Sepúlveda Pertence, seu procurador-geral e articulador da nova lei, Sarney profetizou o perigo com a imagem do promotor hipotético de um lugarejo desconhecido: “imagina que amanhã ele entenda que o casamento do João com a Maria fere algum interesse difuso. Então essa não vou sancionar.” E vetou o artigo.

Integrante da comissão de notáveis que ajudou a escrever a Constituição de 1988, Sepúlveda Pertence foi muito mais longe. Tinha lá suas razões: em 1969 os militares usaram o AI-5 para afastá-lo compulsoriamente da Procuradoria. Garantiu ao MP brasileiro prerrogativas que bem merecem o rótulo de jaboticaba. Em nenhum outro país o Parquet pode tanto. O MP ganhou autonomia funcional e administrativa, vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos. Ganhou. Ganhou mesmo. A sociedade brasileira, farta das deformações do regime militar, deu. Esperava, em contrapartida, uma instituição a protegê-la de abusos seculares.

Mas a popular lei de Gerson também vigora entre promotores e procuradores. Embalados por doses desmedidas de criatividade hermenêutica, sepultaram o sonho de Sepúlveda agregando poderes para muito além do desenho já bastante arrojado, definido pelos constituintes. “Eu não sou Golbery (general criador do SNI, da ditadura), mas também criei um monstro”. Tarde demais…

Em bom manejo do “clamor público”, engravatados arautos da moralidade e justiceiras de scarpin arvoram-se ao poder de interferir em quase tudo. Da ameaça aos direitos difusos, representada pelo casamento de João com Maria, à vida econômica, ao funcionamento da política e do serviço público.

As tais recomendações são, talvez, a melhor síntese da criatividade hermenêutica dos ficais da lei, livres de quem os fiscalize, efetivamente.

A recomendação a alcançar comunicadores que choram a cada dia de pandemia, a morte de um colega vitimado pela covid-19 será útil se cumprir papel pedagógico para ensinar, afinal, que Ministério Público não é Judiciário. Em sintonia, MPF e MPE recomendam que a CIB, instância prevista na Lei Orgânica do SUS com competência legal para decidir sobre políticas de saúde pública, se abstenha de incluir novos segmentos aos chamados grupos prioritários. Recomendaram também aos secretários de Saúde e prefeitos o descumprimento da resolução da CIB. E qual gestor público não teme as investidas potencialmente devastadoras do quinto poder?

A recomendação do promotor Pedro Nogueira Coelho, de Ilhéus, é exemplo lapidar do abuso. Depois de quatro páginas de “considerandos”, recomenda que o secretário municipal de Saúde se abstenha de cumprir a resolução. Pede que Geraldo Magela apresente argumentos técnico-científicos balizadores da decisão que ele não tomou e apenas deveria cumprir.

Como se fosse pouco, o procurador ainda pressupõe que o secretário descumprirá a sua “recomendação” e impõe prazo de 15 dias para “manifestação a respeito do acatamento da presente recomendação, bem como informações acerca das providências adotadas para o seu cumprimento, acompanhadas dos documentos necessários à sua comprovação.”

Parafraseando o saudoso Millôr Fernandes, livre recomendar, é só recomendar. Assim, atrevo-me a recomendar ao Dr. Coelho e pares: abstenham-se de continuar se abstendo no “x” da questão sobre a falta de vacinas para o povo brasileiro. Talvez estivéssemos oferecendo prêmios a quem se vacinasse, como nos Estados Unidos e no Chile, se o MP tivesse “recomendado” às autoridades de plantão, a compra de vacinas, em vez de remédios ineficazes. E com base em critérios técnico-científicos!

De Luis Gama a Barbosa Lima Sobrinho, não faltam interseções entre jornalistas e advogados. Mas as “recomendações” dos MPs revelam-nos mais um traço comum: a criatividade. Como a jornalistas não é permitido exercitar a criatividade hermenêutica dos bacharéis concursados do Parquet, resta-nos a criatividade semântica a serviço da retórica e o “jus sperniandi”. Esperneemos, pois.

Ernesto Marques é é jornalista e radialista, atual presidente da Associação Bahiana de Imprensa.

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Sarau da Imprensa terá Bob Fernandes como convidado (Foto Divulgação).
Sarau da Imprensa terá Bob Fernandes como convidado (Foto Divulgação).

O jornalista Bob Fernades discute A escrita e o poder, na próxima quinta (24), no Sarau da Imprensa, na sede da Associação Bahiana de Imprensa (ABI), no Centro Histórico de Salvador, a partir das 19 horas.

De acordo com o jornalista e idealizador do evento, Ernesto Marques, a escolha de Bob Fernandes como convidado se deu pela relação dele com a Bahia e pela sua trajetória profissional.

– Bob carrega a experiência de quem exerceu o poder da escrita em redações de grandes veículos da imprensa brasileira, viveu uma experiência editorial numa revista como a Carta Capital, até criar um espaço próprio para o seu jornalismo muitas vezes crítico em relação à grande mídia – argumenta.

Marques ainda observa o olhar do jornalista. “É inegável que as novas mídias proporcionam autonomia para quem escreve e democratiza a informação. No entanto, devemos estar atentos e desenvolver um olhar crítico ao que é divulgado. Bob é um bom exemplo do exercício parcimonioso desse poder”.

Como atração musical, uma Jam-session, ou melhor, uma Jam-Jor, formada por jornalistas e aberta a todos os participantes que quiserem compartilhar a sua arte. Todas as atividades são gratuitas.

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Ernesto marques2 www.pimenta.blog.brErnesto Marques

Gente como Edgard ajuda muito a dar sentido à luta. Porque lutamos pelo direito a uma vida plena.

Ok, pronto, já! Gritávamos essas palavras quando todos estavam posicionados na porta do avião para sincronizarmos a saída e evitar perda de tempo de queda livre, após a saída. Perdi as contas de quantas vezes eu e meu amigo-compadre-irmão Edgard Octacílio da Silva Oliveira fizemos isso em saltos a baixa altura, só para completar a lotação do Cesna 182 e assim viabilizar a formação de alunos quando estávamos fundando o paraquedismo na Bahia. O Brasileiro – como o chamávamos e como ele chamava os amigos -, fez o seu último salto ontem (sexta, 16). Partiu para o andar de cima depois de mais de três anos de belíssima luta pela vida.
Perdemos as contas de quantas vezes Edgard morreu desde março de 2011, quando chegou ao Hospital Regional do Recôncavo, em Santo Antônio de Jesus, com falência múltipla dos órgãos. Saí de Salvador desesperado com a possibilidade não mais ver um irmão que a vida com me presenteou.  Eu o vi entubado, inerte, na UTI, e aceitei o prognóstico dos médicos: dificilmente sairia do coma. Conversei com ele assim mesmo. Lembrei das coisas que fizemos juntos, jurei cuidar de Aplo, meu afilhado, e me despedi. Pois ele saiu do coma e ali começou uma luta para permanecer vivo e ativo.
Piadista e exímio contador de casos, brincava com a sua situação e floreava o diálogo com o dono da funerária onde teria sido encomendado o seu enterro: “quero meu dinheiro de volta!”. Dependesse apenas da medicina tradicional, já teríamos chorado as lágrimas de hoje há muito tempo. Mas o Brasileiro nunca desistiu e, com sua determinação, continuou a zombar da medicina. Como alguém pode perder 5 litros de sangue numa hemorragia interna, tendo fígado e rins detonados, e voltar pra contar a história?
Dias antes de partir, acordei às 4 da madrugada com o telefone tocando. Vi o número dele e gelei: como ele já estava internado, precisei tomar coragem antes atender, esperando a má notícia. Era ele mesmo, preocupado com um idoso com quem dividia uma enfermaria do Hospital Sagrada Família. Dias atrás, em outro telefonema, me cobrou uma ficha de filiação ao PT: “você precisa de apoio, e eu e Apolo vamos nos filiar pra lhe ajudar”. Gente como Edgard ajuda muito a dar sentido à luta. Porque lutamos pelo direito a uma vida plena.
Quero contar como o Brasileiro viveu tanto tempo além do primeiro prognóstico médico sobre sua morte. Quero contar como ele conseguiu, depois de tantas visitas ao outro lado, recuperar parcialmente suas funções renais e hepáticas, a ponto de livrar-se do sofrimento nas sessões de hemodiálise por mais de um ano.
Dizem que só se sai da hemodiálise para uma mesa de cirurgia (transplante) ou para um cemitério. Nesse período, Edgard recuperou sua vitalidade e capacidade intelectual, escreveu livros, disputou e venceu um edital público para lançar uma coleção de livros de autores da sua querida Valença e engrenou uma pesquisa que poderá nos levar aos navios torpedeados pelos U-Boats alemães na Segunda Guerra. Mais do que isso: teve chance de conhecer David, seu neto que nasceu no Estados Unidos, e reencontrou o amor numa paixão da adolescência. O cara ainda voltou a fazer amor! Sim, porque transar naquelas circunstâncias era muito mais do que sexo. Nada disso teria acontecido se ele, a família e os amigos, aceitássemos a resignação oferecida pela medicina tradicional diante da morte. Mas ele lutou e venceu.
Quero muito contar como um sujeito genial e algo excêntrico conseguiu ajudar o meu compadre a viver plenamente nesses últimos anos. Não é só um médico, é um autêntico discípulo de Esculápio – talvez por isso seja visto com desconfiança por alguns e odiado por outros. E por isso devo preservá-lo até conversar sobre como poderemos contar essa história, sobretudo porque Edgar É (a morte não lhe tira este mérito, por isso o verbo no presente) uma figura rara, mas felizmente não é única.
Ontem reencontrei o Brasileiro numa UTI, poucas horas antes do seu último salto. Novamente me despedi, jurei honrar a minha obrigação de padrinho e jurei também que quando tiver netos como o seu David, eles saberão quem foi Edgar, o Brasileiro. Ainda com alguma esperança de vê-lo repetir mais uma vez a proeza de voltar, aceitei os fatos. O Brasileiro nunca foi de negar a porta – jargão do paraquedismo para definir quando alguém desiste de saltar na hora da saída. Não o faria desta vez. Ok, pronto, já! Edgard partiu, apenas. Quem viveu com tanta dignidade nunca morre.
Ernesto Marques é jornalista.
Postado, originalmente, no Facebook.

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Ernesto diz que o PT precisa restabelecer o diálogo com os movimentos sociais (foto Pimenta)
Ernesto diz que o PT precisa restabelecer o diálogo com os movimentos sociais (foto Pimenta)

O jornalista Ernesto Marques, vice-presidente da Associação Baiana de Imprensa, tem consciência de que trava uma luta desigual, mas diz que representa a voz da “planície” na disputa pela presidência do PT na Bahia. Segundo ele, o partido se burocratizou, seus dirigentes se encastelaram nas instituições e perderam as linhas de comunicação com os movimentos sociais.

Ernesto prega que é preciso “acordar um certo tipo de dirigente petista que, como diz o presidente Lula, se acostumou a ficar com a bunda na cadeira e se esqueceu de que a obrigação de todo petista é estar o tempo inteiro com um pé na institucionalidade, mas o outro na vida real, na rua”.

O petista, que enfrentará no Processo de Eleição Direita (PED) a poderosa chapa encabeçada por Everaldo Anunciação, secretário estadual de Organização do PT, discorda dos “companheiros” que classificaram as manifestações de junho como orquestrações da direita e afirma que os brasileiros finalmente aprenderam que a democracia funciona.

Em tempo: as eleições dos novos diretórios petistas em todo o País serão realizadas no dia 10 de novembro.

 

PIMENTA – Para começar, como o senhor avalia essa situação ma disputa pelo diretório de Salvador, onde o secretário Rui Costa teria incentivado a formação uma chapa para combater Marta Rodrigues, liderança ligada a Walter Pinheiro. Já temos aí uma prévia da disputa de 2014?

Ernesto Marques – O que está em vias de se configurar em Salvador é mais ou menos o que a gente observava no começo do ano, como aglutinação de campos divergentes dentro do partido. Nós criamos um campo chamado “PT Mais Forte”, que deu origem à nossa chapa e tinha basicamente as mesmas forças que hoje estão se aglutinando em torno de Marta (Rodrigues). É claro que para nós já estava evidente, desde aquele primeiro momento, onde se encontram as contradições. Não era à toa que nós constituíamos esse campo, exatamente na expectativa de ter um espaço para debate sobre 2014, mas também sobre 2013.

PIMENTA – Onde estão as contradições?

EM – Primeiro você estrutura um partido, prepara esse partido do ponto de vista organizativo, para que então você tenha melhor condição de enfrentar a batalha eleitoral. Os argumentos do agrupamento majoritário foram suficientes para quebrar a unidade do campo, mas não para nos submeter a ponto de aderir à ideia do “chapão”.  Decidimos manter a postulação que já apresentávamos antes, de que esse agrupamento tinha consistência e força política para disputar e vencer as eleições internas do partido. Como houve algumas defecções, inclusive da própria EDP (Esquerda Democrática Popular), liderada pelo deputado (Nelson) Pelegrino, nós mantivemos a nossa “levada” e estamos cada vez mais convencidos do acerto da nossa posição.

 

PIMENTA – Mas há um tensionamento no PT na capital…

EM –  O tensionamento em Salvador recoloca exatamente o confronto, no bom sentido, como nós estamos acostumados no PT, entre dois campos que têm visões não exatamente opostas, mas em alguns pontos divergentes em relação à condução que deve dar ao partido aqui na Bahia, assim como com relação às questões nacionais. Há uma tentativa de antecipar as coisas em relação a 2016, o que talvez seja um pretexto para se aglutinar um bloco com a intenção –  segundo se diz na imprensa, mas não ouvi isso de nenhuma liderança – de isolar o deputado Nelson Pelegrino dentro da sua principal base, que é Salvador e a Região Metropolitana. É difícil fazer isso porque qualquer pessoa pode contestar a trajetória do companheiro Pelegrino, mas ninguém pode negar a liderança que ele é e o papel que exerceu na construção do partido em Salvador. A capital hoje é o berço do que antes a gente chamava de carlismo e nós não temos nenhuma dúvida de que precisamos fazer uma oposição muito séria, consistente e contundente à Prefeitura, e isso não se confunde com fazer oposição à cidade, são coisas muito diferentes. Temos visões muito diferentes sobre como tratar os problemas de Salvador.

PIMENTA – O senhor faz uma crítica à forma como o PT fez oposição a João Henrique e propõe uma atuação diferenciada agora com ACM Neto. Em que pontos devem se estabelecer as diferenças?

EM – Há uma coisa muito estranha quando o prefeito propõe o aumento do IPTU e cinco dos sete vereadores do PT aprovam esse aumento. É um sinal muito preocupante de que o partido não está conseguindo tratar as matérias adequadamente e esgotar o debate interno antes de ir para as votações na Câmara. Segundo o tributarista e também vereador Edvaldo Brito (PTB), é um aumento que pode chegar a 35% e ainda restabelecer a tributação em cascata, que é uma coisa que o Brasil já tinha abolido há muito tempo. O vereador Waldir Pires (PT) também já apontava sérios vícios de inconstitucionalidade na reforma tributária. Essas questões estão sendo tratadas como se cada vereador fosse dono do seu mandato, mas na verdade os mandatos pertencem ao partido, e este faz oposição ao prefeito ACM Neto. No fundo, o que está em jogo é qual a qualidade da oposição que vamos fazer. Será uma oposição low profile, de baixa intensidade, ou faremos uma oposição sistemática, que, repito, não se confunde com oposição à cidade, mas deixa muito claro qual é o entendimento nosso sobre política urbana, habitação popular, transporte público, movimentos sociais e mais uma série de questões que nos diferenciam bastante. E não dá para misturar água com óleo.

PIMENTA – O senhor discorda da política de “boa vizinhança” entre o PT e ACM Neto?

EM – Essa tentativa de isolar Pelegrino talvez seja exatamente pelo desejo de fazer uma oposição de baixo perfil, o que, no caso do prefeito João Henrique, gerou para nós uma conta muito grande a pagar. Inclusive porque uma parte da população de Salvador não identificava os investimentos do Estado, vendo-os como obras do ex-prefeito João Henrique, a exemplo da Via Expressa. O fato de termos apoiado João Henrique no segundo turno de 2004 e termos participado de seu primeiro governo deixou essa coisa mal resolvida, porque o PT não apresentou claramente para a cidade se era oposição ou se era situação no governo João Henrique. Neste atual governo, não pode haver qualquer margem de dúvida, até porque o prefeito ACM Neto, com toda justiça, personifica o outro campo da política baiana, contra o qual nós sempre nos opusemos. Não há porque mudar de posição, tendo em vista que o prefeito ACM Neto continua fiel ao seu berço político e nós também não mudamos. Pelo menos uma parte do PT.

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Não há porque mudar de posição, tendo em vista que o prefeito ACM Neto continua fiel ao seu berço político e nós também não mudamos. Pelo menos uma parte do PT.

 

PIMENTA – Esses conflitos do PT não decorrem da opção que o partido fez pela política de alianças para alcançar resultados eleitorais? Ou seja, não é uma consequência do pragmatismo do partido?

EM – O PT vive problemas que são naturais em um partido que tem 33 anos de idade, embora não seja um dos partidos mais velhos do país. Nesse tempo, nós deixamos de ser um partido pequeno, de gueto, para progressivamente conquistar cadeiras nos parlamentos em todos os níveis: prefeituras, governos estaduais, até o governo federal. A gente vive as dores de um partido que já tem um bom tempo no governo e este exercício naturalmente expõe as nossas contradições, o que inclusive é muito salutar, principalmente se a gente entende a contradição como uma coisa natural da democracia, a ser enfrentada sem muito receio.

PIMENTA – Seria o lado positivo da crise?

EM – Essa é a parte da crise que eu acho natural e a gente tem que conviver com ela, discuti-la exaustiva e permanentemente, para encontrar as saídas sem perda de consistência política. Em relação a alianças, a história mostra que ninguém ganhou sozinho. Nem nas revoluções armadas, nem nos processos democráticos. Sempre é necessário se fazer alianças e na democracia ganha mais quem agrega mais. O governador Jaques Wagner ensina isso e reafirma a todo tempo. Fazer alianças não é problema e isso o PT já tem resolvido há muito tempo. Você pode questionar a qualidade das alianças e a gestão dessas alianças após as eleições. Nós podemos observar que é difícil constituir e manter uma aliança que seja muito ampla no espectro ideológico e no aspecto numérico.

PIMENTA – Não é esse o caso da aliança “super ampla” em torno do governo Wagner?

EM – Gerir uma base com cerca de 50 parlamentares em 63 é de fato uma engenharia política extremamente complexa. Aquela lógica que a gente aprende em casa, de ceder sempre o  lugar para a visita, é mais ou menos assim que acontece na política. Para acomodar os aliados, é natural que o partido que é o centro da aliança seja mais generoso na abertura de espaços para acomodar os aliados. O problema é exatamente a gestão desses espaços e nos parece que houve equívocos graves na direção partidária, na hora de gerir as alianças, seja na distribuição dos espaços no governo, seja no posicionamento na hora das coligações. Ter ex-carlistas no governo também não representa nenhuma dificuldade porque comunistas trabalharam nos governos carlistas o tempo inteiro, ou sendo servidores de carreira, e portanto cumprindo sua obrigação como servidor público, ou em alguns casos porque atenderam convites profissionais e tiveram também que de alguma maneira cumprir uma tarefa política. E eu não me lembro de um governo carlista ter virado comunista por causa disso.

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