Lincoln, do Goiás, e Maurício Duarte, do Vila Nova, disputam bola no Serra Dourada || Arquivo/Walmir Rosário
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Certa feita, ao jogar na Gávea contra o Flamengo, ao tentar tirar a bola do craque Zico, que a adiantou com um toque, passou reto com o carrinho, numa jogada que terminou em gol.

 

Walmir Rosário

Nem todos os meninos peladeiros conseguem tirar a sorte grande jogando os babas apenas nas praias ou nos campinhos de bairro. Muitos são levados para os times consagrados, nos quais aprendem a se especializar no futebol. Os que conseguem unir a habilidade individual às técnicas e táticas, teoricamente terão um futuro garantido e nome gravado entre os astros do futebol.

Por ironia do destino, um garoto peladeiro deixa sua cidade natal, Porto Velho, em Rondônia, e vai para o Rio de Janeiro, acompanhar sua mãe em tratamento médico. Era tudo que queria. Se já se encantava com o futebol jogado na cidade maravilhosa pelas ondas do rádio, agora se imaginava ser um daqueles craques que tanto assistia no rádio e na TV. Finalmente era chegada a hora e a vez do garoto Maurício Duarte.

E tudo se encaminhava conforme seus pensamentos. Em pouco tempo já disputava bola nas areias da praia de Copacabana com a desenvoltura de um atacante, atuando pelas equipes praianas do Radar e do Copa Leme. Mas queria o destino um futuro mais brilhante para a promessa de craque rondoniense. Foi descoberto pelo maior e mais excêntrico “olheiro” de futebol carioca, Antônio Franco de Oliveira, o Neném Prancha.

Botafoguense de quatro costados, Neném Prancha, considerado o maior dos filósofos do futebol, o levou para o seu time de coração, o Botafogo. Aos 12 anos o garoto se deslumbra com a plêiade de craques que ouvia e via jogar no rádio e na TV. Mais que isso, iria participar de uma peneira e, se aprovado, poderia ser um deles, afinal, tinha como padrinho Neném Prancha, o descobridor de Heleno de Freitas e Júnior “Capacete”.

Diante da enorme concorrência, lhe ocorreu uma estratégia de defesa que o fez sobreviver nos gramados de General Severiano. Assim que o treinador e antigo lateral-direito Joel Mendes dividia as promessas de atletas pelas posições que jogavam, Maurício Duarte se assombrou pela quantidade de atacantes e meios-campistas. Os pensamentos rodaram com extrema velocidade em sua cabeça e decidiu: a partir daquele momento seria zagueiro. E para jogar no Botafogo!

E a sorte lhe sorriu, tanto assim que após ver de perto “os cobras” do Glorioso, a exemplo de Gérson, Fischer, Jairzinho, Brito, Manga, dentre outros craques, foi aprovado para a famosa Escolinha de Seu Neca, pela qual passaram as estrelas do Botafogo dos anos 1970, inclusive ele. Descoberto por Neném Prancha, agora teria a felicidade de aprender com seu Neca todas as técnicas e artimanhas do melhor futebol do mundo.

E o garoto magro de Porto Velho iniciou os treinamentos na Escolinha do Neca, no Botafogo, no subúrbio de Del Castilho. Era um sacrifício danado, pois pegava dois ônibus lotados para participar do treinamento coletivo às quartas e sextas-feiras. No restante da semana treinava em General Severiano. Se firmou como zagueiro e ganhou posição nas divisões de base, até que chegou o dia de ser incorporado ao time de cima.

Era o ano de 1970. E Maurício Duarte, aos 17 anos, teria a responsabilidade de substituir o zagueiro Brito, convocado para a Seleção Brasileira tricampeã do mundo. Jogaria a Taça Guanabara, posteriormente cancelada, e os jogos amistosos, o primeiro deles contra o Bangu, vencido pelo placar de 2X0. Junto com os profissionais, lembrava dia e noite os ensinamentos do seu Neca, essenciais para a sobrevivência nos gramados da vida.

Nos treinos do Botafogo marcava grandes jogadores de ataque. Certa feita, ao jogar na Gávea contra o Flamengo, ao tentar tirar a bola do craque Zico, que a adiantou com um toque, passou reto com o carrinho, numa jogada que terminou em gol. Aí ouviu do seu Neca: “Você não teria que ter dado o carrinho e sim cercado; acompanharia a jogada e ele não teria toda a tranquilidade. Lembre-se, zagueiro caído é jogador abatido”.

De outra feita, no Maracanã contra o Vasco, quando foi marcar Roberto Dinamite, ouviu outro ensinamento do seu Neca: “O zagueiro tem que ficar com um olho no peixe e outro no gato”. E era para observar a bola e Roberto Dinamite, que ficava de “migué”, na ponta-esquerda quando a bola vinha pela direita. E esse ensinamento lhe serviu para o resto da vida, tomando ou não deixando a bola chegar aos atacantes.

Do Botafogo, Maurício Duarte se transferiu para outros clubes brasileiros, nos quais experimentou a diversidade na realidade do futebol praticado nos quatro cantos deste país. E sua saída do Glorioso se deu por motivos internos. Quando chamado de volta pelo Departamento Amador, acreditou que seria um regresso e não atendeu ao pedido. Daí passou a treinar no “time da Ave Maria”, no finalzinho da tarde, com chances remotas.

Emprestado ao Remo, do Pará, Maurício não foi muito feliz, pois teve uma distensão na virilha. Em seguida se transforma num operário da bola e joga no Santo Antônio e Rio Branco, ambos no Espírito Santo, Flamengo do Piauí, Vila Nova de Goiás, Galícia, Olaria e Itabuna. Nesses times atuou com e contra grandes craques do futebol brasileiro, muitas das vezes sem receber salários em dia, dentre outras adversidades.

No Itabuna Esporte Clube, o último time por qual jogou, Maurício Duarte se identifica bastante com a diretoria e a cidade. E por aqui constrói família, faz um curso de formação em técnico de futebol, trabalha na AABB, dirige as seleções de Itajuípe, Itabuna e Buerarema. Certificou-se em Radialismo, atuou como comentarista em emissoras de rádio e Maurício Duarte se torna um verdadeiro cidadão grapiúna.

Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado.

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Caso seja bafejado pela sorte, ou quem sabe, a técnica, defendendo sua retaguarda, é aplaudido efusivamente pelos torcedores de sua equipe e xingado pela torcida adversária. Se não foi feliz na sua intervenção, “a casa cai” e imediatamente ganha, no mínimo, a alcunha de frangueiro

Walmir Rosário || wallaw2008@outlook.com

Não sei como surgiu a homenagem aos goleiros, comemorada em todo o mundo no dia 26 de abril. Goleiro é uma das posições que não admitem falha, pois no futebol é o gol quem “manda” e quem marca mais ganha o jogo, o turno, o campeonato. Goleiros bons já tivemos à mancheia, embora os milhões de comentaristas brasileiros sempre disseram que eles não sabiam sair das quatro linhas como os europeus.

Na seleção canarinho sempre foi motivo de amor e ódio. Que o diga o goleiro da Copa de 50, Barbosa, que tomou os dois gols do “Maracanaço”, marcado para sempre e morreu com esse desgosto. Dizem até que o lugar do goleiro – embaixo dos três paus – é tão amaldiçoado que não nasce grama. As diferenças entre o goleiro e os atacantes são abissais e ninguém enfarta caso um atacante perca um gol, mas morre se o goleiro toma.

Marcadas as diferenças, alguns goleiros sabem se impor e conseguem fazer história nos times por que passam – com raríssimas exceções – e na Seleção Brasileira, outros não conseguem essa proeza. Guarda-redes, goalkeeper, arqueiro ou simplesmente goleiro é aquele que consegue fazer voos sensacionais para tirar, com a ponta dos dedos, a bola da direção do gol, se jogar nos pés do atacante, calcular o lado certo da batida da falta ou do pênalti.

Caso seja bafejado pela sorte, ou quem sabe, a técnica, defendendo sua retaguarda, é aplaudido efusivamente pelos torcedores de sua equipe e xingado pela torcida adversária. Se não foi feliz na sua intervenção, “a casa cai” e imediatamente ganha, no mínimo, a alcunha de frangueiro e perde a admiração da torcida e a confiança do treinador e dos cartolas do clube, mesmo sendo o petardo disparado pelo adversário indefensável.

Neste domingo (26), Dia do Goleiro, fiz questão de homenagear o arqueiro Manga, que sabia se colocar em frente da trave como ninguém. No Botafogo foi Campeão Carioca em 1961, 1962, 1967 e 1968, Taça Brasil de 1968, Rio-São Paulo de 1962, 1964, 1966. Já que falei de estatística, pelo Botafogo jogou 442 partidas e sofreu 394 gols. Também jogou 12 partidas pela Seleção Brasileira.

Manga em ação defendendo o Botafogo (RJ)

Pelo Botafogo passaram grandes goleiros, com os quais me identifiquei bastante, mas Manga sempre foi especial pela sua presença e firmeza na pequena área e impunha respeito ao abrir “as asas” e deixar o atacante perdido, sem saber o que fazer. Melhor, ainda, quando o próximo jogo era contra o Flamengo e ele não perdia a esportiva ao dizer que tinha recebido o “bicho” pela vitória antes mesmo do jogo.

Já Maurício Duarte, ex-jogador profissional de grandes equipes brasileiras (Botafogo, inclusive), radialista, comentarista de futebol, amigo de excelente caráter, homenageou o goleiro Laércio, do Itabuna. E a homenagem foi prestada em tempo certo a uma pessoa que não mais se encontra entre nós e fez história no Itabuna Esporte Clube e em Itabuna, chegando a ser o xodó da torcida pelas grandes atuações dentro e fora do campo.

Itabuna sempre foi pródiga em bons goleiros desde os tempos do futebol amador – Fluminense, Flamengo, Grêmio, Janízaros, Bahia, Itabuna, Corinthians e Botafogo, este com um fato inusitado: o goleiro Danielzão mais tarde trocou de posição e passou a jogar como centroavante. Esses mesmos goleiros dos clubes defenderam com mãos de ferro a Seleção de Itabuna, vencedora do Intermunicipal por oito anos seguidos: Octacampeã.

Desfilaram em baixo dos três paus da seleção itabunense os goleiros Carlito, Asclepíades, Ivanildo, Plínio, Luiz Carlos, Betinho, dentre outros, que escreveram seus nomes da história do futebol itabunense. Goleiros que defendiam bolas impossíveis e se atiravam nelas como um esfomeado em busca de um prato de comida, para não deixar de citar a rica e bela gíria futebolística, além dos altamente técnicos.

É uma justa homenagem a um profissional – antes amador – que destoa dos colegas de equipe desde pequeno, por ser raro os que têm o sonho de ser goleiro e lutam para isso nos babas e escolinhas de futebol. Não raro, os goleiros são descobertos por serem aqueles que não têm talento para jogar na zaga, meio do campo e ataque e são escalados nos babas como goleiro, posição pouco disputada nos campinhos.

Por isso e tudo isso, minhas homenagens aos goleiros do Brasil e do mundo. Vai que é sua, Tafarel!

Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado.