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Eduardo Estevam
 

A reação ao rolezinho revela uma luta de classes e uma brutal exclusão social, mas tem um elemento que considero central e que desmascara a “cordialidade” brasileira nas relações sociais: o racismo.

 
Onda Negra, medo Branco é o título de um livro em que a Celia Azevedo analisa o negro no imaginário das elites do século XIX. O rolezinho pode ser considerado uma onda negra, uma vez que apresenta traços culturais da musicalidade negra, e o medo, que residia na elite branca, hoje genaralizou-se.
O fenômeno chamado Rolezinho é apenas uma das práticas sociais dos jovens que fortalece sua identidade de grupo, cada qual com as suas particularidades. Esse tipo de rolezinho é o divertimento em grupo, ponto de encontro (combinados pela redes sociais ou não), a curtição, a azaração que sempre esteve sob olhar raciológico vigilante. O rolezinho que causou pânico nos shoppings apresenta algumas peculiaridades que há tempos venho defendo neste blog. A existência de um racismo que estrutura as relações e a forma de pensar e ver o outro na sociedade brasileira, e que é veementemente negado, principalmente pela grande mídia.
A reação ao rolezinho revela uma luta de classes e uma brutal exclusão social, mas tem um elemento que considero central e que desmascara a “cordialidade” brasileira nas relações sociais: o racismo. Não é de agora que esses jovens frequentam os shoppings, logo, essa prática não pode ser atribuída tão somente as mudanças do quadro econômico e social que possibilitou uma ampliação do mercado consumidor. A simples presença desses jovens negros e negras, negro-mestiços e branco-mestiços ostentando suas identidades culturais, foi motivo do estranhamento, do surto, do medo e da repressão, tudo em função de se aglutinarem e passearem gesticulando e cantando música funk. Esse tipo de racismo que esses jovens negros estão sujeitos caracteriza-se pelos embates culturais, ou seja, pelo conflito de valores.
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barros rolezinhoDaniel Martins de Barros | Psiquiatria e Sociedade

O ideal seria estabelecer um diálogo entre visões diferentes na tentativa de entender o que são de fato esses rolezinhos. Porque sem isso não conseguiremos lidar com seus significados reais.

Os rolezinhos são um dos fenômenos recentes mais intrigantes em minha opinião: eles reúnem elementos de diversas naturezas, em suas causas e consequências, desafiando aqueles que buscam uma compreensão do que está acontecendo. Por se prestarem a diversas leituras, cada um vê neles o que bem entende, muitas vezes hostilizando opiniões divergentes. Creio que sejam suas muitas camadas, não mutuamente excludentes, que embaçam um pouco nossa visão.
Antes de mais nada, independente das motivações subjacentes, não se pode negar que eles são fruto da hiperconectividade proveniente do amplo acesso da população à internet e às redes sociais. Como no caso das manifestações que sacudiram transitoriamente o país em 2013, trata-se de um comportamento emergente. Isso significa que o movimento surge a partir da interação entre múltiplos elementos mais simples – no caso, as milhares de pessoas – mas não pode ser explicado apenas pelo comportamento individual dos envolvidos. A complexidade que nasce a partir das diversas interações faz com que o fenômeno seja imprevisível; é impossível vislumbrá-lo previamente, mesmo conhecendo os envolvidos.
Mas só a conexão ampla sozinha não basta. Claro que existe aí um colorido social, já que as ações são altamente simbólicas quando jovens da periferia organizam-se para ocupar em massa os espaços de consumo que são os shopping centers. Diante do discurso oficial que arbitrariamente mudou a classificação de milhões de pessoas de pobre para classe média baseado em seus hábitos de consumo de eletrodomésticos (mesmo que a custa de crédito, não de ganho), os rolezinhos mostram que penetrar na esfera do consumo não basta. Os shoppings, templos do supérfluo, não permitem que haja dúvida sobre quem é excluído mesmo após se tornar consumidor.
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