O poeta saiu pela tangente de maneira bem-humorada: “Então, Baden, Chopin esqueceu de fazer essa”. Em seguida se dirigiu à máquina de escrever.
Marival Guedes || marivalguedes@yahoo.com.br
Há duas décadas o Brasil perdeu um dos maiores músicos. Baden Powel morreu de infarto, aos 63 anos, no dia 26 de setembro de 2000. Aproveito e compartilho uma história interessante que ele contou durante um show.
Baden era amigo de Vinicius de Moraes (1913-1980) e frequentava a casa do poeta em Petrópolis para comporem e beberem uísque. Ou vice-versa.
Numa dessas mostrou uma música para o parceiro colocar letra. Vinicius gostou, mas até a madrugada não tomou iniciativa alguma. Baden reclamou: Já estamos na terceira garrafa, quase bêbados, são três da madrugada e a letra não saiu…
O poeta disse que aconteceu uma coisa chata, mas não iria contar por ser muito desagradável. Diante da insistência, revelou:
-Eu acho que é plágio
-Porque não disse antes? Eu não teria tocado tantas vezes.
-Mas é e não fica bem. Vai sair nos jornais, “ Vinicius e Baden plagiam música.
-Não é plágio. Mas diga, de quem?
-É claro, Baden, isso aí é Chopin
-Não Vinicius, eu conheço Chopin, não tem nada a ver
-Eu tenho ouvido, Baden, isso é Chopin puro. Você bebeu demais, fez uma música pensando que era sua e não é.
-Não Vinicius, eu acho que quem bebeu demais foi você e está implicando comigo.
-Então pra acabar esta dúvida vou chamar minha mulher, a Lucinha. Ela toca piano e conhece toda a obra de Chopin.
-Vai acordar sua mulher esta hora?
-Ela está acostumada.
Lucinha chega e oferece café, mas Baden gentilmente rejeita argumentando não ser bom misturar. O poeta pediu pra o músico tocar. Em seguida, afirma que é Chopin e pede a opinião de Lucinha, que dá o veredicto: “ Não Vinicius, eu conheço as coisas de Chopin, isso não é Chopin.
Segundo Baden, Vinicius ficou “sem graça” e falou: “até você tá contra mim?”
“Não Vinicius, ninguém está contra você,” interferiu o músico.
O poeta saiu pela tangente de maneira bem-humorada: “Então, Baden, Chopin esqueceu de fazer essa”. Em seguida se dirigiu à máquina de escrever.
Nascia a belíssima Samba em Prelúdio.
Marival Guedes é jornalista.