Tempo de leitura: 4 minutos

Aldineto Miranda | erosaldi@hotmail.com

Quem se propõe a ser professor, cria laços de amor com a educação que, aos poucos, vão sendo desatados pelo dia a dia maçante e pelo descaso daquelas mesmas pessoas que utilizam de um belo discurso para ganhar as eleições.

Intitulei esse texto – Ser Professor no Brasil hoje, parafraseando um texto de Milton Santos, cujo título é “Ser Negro no Brasil Hoje”, em que o autor descortina o racismo velado que ainda existe no Brasil. No presente texto, tenho como objetivo, ainda que o foco seja diferenciado, descortinar outro tipo de pré-conceito, ou seja, um conceito visto de forma totalmente enviesada com relação a ser professor no Brasil.

Comecemos a pensar em como a educação é percebida em nosso país. Educação por alguns é vista como formação para conseguir um emprego para a mera sobrevivência material; por outros, alguns politiqueiros, é percebida como um instrumento de discurso. Jamais é percebida como formação integral do ser humano e, consequentemente, do cidadão!

Todo candidato a presidente, senador, deputado, vereador… utiliza-se do discurso repetitivo “a educação no Brasil poderia ser melhor, tudo é um problema de educação…” Há dias, vi a primeira presidenta do Brasil afirmar que há mais alunos na escola, e que o índice de analfabetismo diminuiu radicalmente. Sim, e concordo.

Tenho muito respeito para com a presidenta, mas infelizmente seu discurso ainda carece de materialidade. Que houve avanço na educação brasileira, há mais pessoas cursando o nível superior, há mais alfabetizados, é inegável. Mas o que questiono é a qualidade em que tudo isto é realizado. Educação não são somente números, em que se mostram os superávits e déficits, mas matéria humana.

Mais grave do que o analfabetismo é uma alfabetização falsa em que se lê, mas não compreende. Mais grave do que uma nação com poucos profissionais com nível superior são profissionais que possuem tal nível e agem simplesmente como técnicos frios, que não compreendem seu papel social e não desenvolvem o gosto pela pesquisa. E assim não criam, só reproduzem. Mais perigoso do que um país sem técnicos, é um país com pessoas com uma formação técnica deficitária.

Todos esses problemas perpassam pela valorização deste profissional que não é pai dos alunos e não é sacerdote e, sim, professor! Não é um mero técnico que simplesmente desempenha uma função, mas um ser crítico, na maioria das vezes – e que, por ter compromisso e necessidade de sobrevivência material, se curva a um sistema social que somente o valoriza no discurso. Quando afirmo isto não estou me referindo simplesmente ao político partidário, mas aos outros atores sociais, ao homem comum que, diante da indignação dos professores, se cala, como se não fosse problema seu, porém é sim um problema de TODOS!

Ser professor no Brasil hoje é estar a todo o momento tampando buracos ou buscando impedir que hajam buracos fundados pela organização social desigual que existe em nosso país. O professor não é herói, e não pode querer sê-lo. Sou professor, e afirmo, ousando agregar às minhas palavras as vozes de todos os meus colegas de profissão: Desejamos ser vistos como profissionais que dedicaram não somente quatro de anos suas vidas em estudo e pesquisas, tempo da maioria dos cursos de licenciatura, mas geralmente seis, sete, oito anos ou mais entre aperfeiçoamentos, especializações, mestrados e doutorados.

O professor tem que trabalhar em vários lugares, e naqueles em que se paga um pouco a mais pela dedicação exclusiva, se faz como se fosse uma doação e não o direito do professor. Temos direito a um salário condigno com uma profissão em que o trabalho inicia na escola e continua em casa.

Vejamos o que um professor faz: No colégio leciona, faz chamada, preenche pautas, participa de reuniões pedagógicas, faz parte de colegiados, ou coordenações, que no máximo diminui irrisoriamente sua carga horária de aula, escuta os alunos, propõe-lhes atividades, as corrige em sala. Realiza dinâmica e em alguns casos fica até mais tarde explicando algum assunto que ainda ficou obscuro para algum discente. E quando está em casa, têm que preparar aula, pesquisar textos, músicas, filmes para incrementar suas aulas, faz plano de aula, plano de curso. E cria em grupo ou individualmente projetos para serem desenvolvidos na escola. Ufa! E não me referi aos cursos paralelos de especialização que, na maioria das vezes, são bancados pelo próprio docente.

Serei direto, valorização do professor perpassa por um bom salário, queremos ganhar bem! Sem rodeios e sem receios digo isso. Claro que há maus profissionais, mas estes são poucos, bem poucos, e em que profissão não as há?

Quem se propõe a ser professor, cria laços de amor com a educação que, aos poucos, vão sendo desatados pelo dia a dia maçante e pelo descaso daquelas mesmas pessoas que utilizam de um belo discurso para ganhar as eleições.

Educação de excelência acontece com um investimento maciço e ate exagerado em educação, para termos colégios com uma estrutura bem organizada, professores com bons salários e com boa formação, que se dediquem a desenvolver extensão e pesquisa na educação básica. Em pouco tempo veríamos os frutos de uma educação verdadeiramente valorizada.

Infelizmente isto ainda é utopia… A Copa do Mundo, as Olimpíadas, a maquiagem de que vivemos num país sem problemas sociais, problemas advindos em boa parte de uma educação precária, é mais importante. Afinal somos um “país emergente”, olhem aí mais um discurso proliferado…

Discursos, discursos, discursos… Estou farto de palavras vazias, necessitamos de ação! Como diria o saudoso Paulo Freire: “Se a educação sozinha não pode transformar a sociedade, tampouco sem ela a sociedade muda”. Essas palavras de Freire, carregadas de boniteza e sabedoria, estão mais atuais do que nunca.

Aldineto Miranda é professor graduado e especialista em Filosofia e mestrando em Linguagens e Representações, além de lecionar no Instituto Federal da Bahia (Ifba).

23 respostas

  1. Sua matéria, além de esclarecedora,disserta com coragem a situação da educação no momento atual.É estarrecedora a falta de qualidade do ensino.Brinca-se de ensinar e os alunos, de aprender.O descaso com o ensino, foge às regras da normalidade.

  2. Sua matéria, além de esclarecedora,disserta com coragem a situação da educação no momento atual.É estarrecedora a falta de qualidade do ensino.Brinca-se de ensinar e os alunos, de aprender.O descaso com o ensino, foge às regras da normalidade.Falta vontade política para oferecer ao professor condições dignas de viver e de se qualificar.

  3. O problema e que muitos Professores tem um discurso romântico, pouco pratico, digno de sonhadores.

    Outra coisa e a distancia que as pessoas de bem tem da política.

    Isto junto, combinado, e um verdadeiro paraíso para os medíocres dominarem o cenário político municipal, estadual e nacional.

    Ate quando nos nos acovardaremos?

    Esta provocação e justamente para causar reflexão!

  4. Caro professor estou feliz por que no meu(nosso) Brasil, existe pessoas que pensam como você.
    Não acredito em democracia da compra de votos,uma verdadeira promiscuidade de eleitor e candidatos que ocorre em nosso pais.Enquanto esse modelo que ora funciona para eleger os endieirados e não competentes e compromissados com a construcão cidadã, estamos ferrados!

  5. Valeu professor, o povo ainda continua como meros cidadãos e cidadãs que não são chamados a decidir politicamente em seus municípios, Estado e Nacionalmente. Servimos apenas para votar, consumir e nada mais. A comunicação passa contrvalores insistetemente até que se torna verdade e a maioria das pessoas absorve e passa a ser seguidora

  6. Robson tambem me solidarizo contigo. Mim não conjuga verbos, o correto é me solidarizar. Faltou um bom professor.
    Mas está valendo.
    Esse Aldineto foi meu colega, sempre foi esforçado. Uma pena que escolheu uma profissão tão ingrata onde o mestrado vai lhe valer pouco.

  7. concordo com todos os comentarios e principalmente com o desabafo do professor, so nao entendo é porque diante disto tudo a pessoa ainda quer ser professor…porque nao buscam outra profissão? Se é por amor entao nao lamente, apenas faça o que ama..eu realmente não entendo..é como policial, todos fazem o concurso sabendo que o salario nao vale a pena, nao sei porque fazem..eu hem????
    OBS – Quero deixar claro que nao estou defendendo politicos, de forma alguma, tanto que este ano nao voto pra nenhum destes mentirosos.

  8. OS PROFESSORES E PROFESSORAS DE HOJE TEM TODA LIBERDADE, MAS QUEM NUCA BEBEL MEL QUANDO BEBE SE LAMBUZA ,HÁ SE SÓCRATES TIVESSE TIDO TODA ESSA LIBERDADE QUE HOJE VOCÊS TEM !HÁ DESCULPEM-ME !SÓCRATES TAMBÉM ERA PENSADOR , TALVEZ SE ELE FOSSE SÓ MAIS UM PROFESSOR TIVESSE TIDO UMA VIDA MELHOR .

  9. Caro Aldineto
    Poucos são os textos um pouco mais longos e expostos em blogs que consigo ler até o final. Não foi o caso do seu.

    Só não digo que você disse tudo, porque, mais do que eu e como filósofo, você sabe que não há enunciado completo capaz de esgotar um assunto – em especial este -, e que todo conhecimento é inacabado e torna-se superado quando adquirido.

    Estou professor há 12 anos, depois de ter dedicado 30 anos de minha vida à defesa da Pátria.

    De uns tempos para cá passei a sofrer desta síndrome:

    “Quem se propõe a ser professor, cria laços de amor com a educação que, aos poucos, vão sendo desatados pelo dia a dia maçante e pelo descaso daquelas mesmas pessoas que utilizam de um belo discurso para ganhar as eleições.”

    E os laços foram afrouxando, e afrouxando… até o total desatamento; quando tomei a decisão de “abandonar” meus alunos para retornar às fileiras da Briosa Força Armada, mediante contrato temporário de trabalho, em troca de um pro-labore de 30% dos vencimentos que supera o salário de um professor com 40 horas semanais.

    Vou ficando aqui na Briosa, onde também posso oferecer minha contribuição à “sociedade” (temos?) (somos?), enquanto aguardo os 65 anos para a aposentadoria do magistério.

    Meus alunos? Ah! Encontram-me e interrogam-me: “E aí professor! Quando o senhor volta? Estamos sentindo sua falta!”

  10. ok! anônimo, fico grato de ser corrigido ortograficamente por tão ilustre saber, uma pena não ter se identificado, assim poderia lhe consultar, se possível lógico, em outras oportunidades, pôs como vc já identificou,(mim ), ou (me), faltou um bom professor , mas como desse estar valendo.

  11. Parabéns pelo excelente texto Neto !!!!

    Você sempre foi competente no que faz.Já demonstrava isso,( quando fazíamos Magistério no Instituto Municipal de Educação Azis Maron-IMEAM de Itabuna; 2000 à 2002), e também quando a meu convite participou do Fundo de Ação Sócio Cultural-FUNASC,Ensinando Filosofia e Atualidades, (no Pré-vestibular gratuito do Bairro São Pedro.

    Neto,um forte abraço para Você e Dona Maria Lúcia.Quando eu for ai em Itabuna,te visitarei.

    José Roque Santos
    Administrador p/ Unime de Itabuna,escritor do livro; Taboquianos 2010,e Presidente da JMAConstruções em São Paulo.

  12. Sou esposo de uma professora e sinto na pele os efeitos colaterais dessa sofrida profissão.Mal remunerados e pouco reconhecidos,só lhes sobra o stress do penoso trabalho.

  13. Não poderia ler esse texto e não comentar, como sempre escrevendo como ninguém, mostrando de forma cara a dura situação de ser um professor nos tempos de hoje…
    PARABÉNS MEU IRMÃO … precisamos de mais textos como esse nos blogs e nos jornais ..

  14. RESPOSTA AO COMENTÁRIO DE TIANA, EM RELAÇÃO AO TEXTO DE ALDINETO:
    “O AMOR TEM RAZÕES QUE A PRÓPRIA RAZÃO DESCONHECE”, AMOR É ESCOLHA. ESCOLHER SER PROFESSOR NÃO É SE BUROCRATIZAR, MAS UMA LUTA CONSTANTE PARA SE MANTER HUMANO E HUMANIZADOR. FALAR DAS MAZELAS ENFRENTADAS PELO FATO DE SER PROFESSOR É MATER UMA ATUAÇÃO DESMECANIZADORA NESTE SISTEMA DE COISAS, NO QUAL ESTAMOS INSERIDOS, E POR ISSO MESMO NÃO PODERÍAMOS SEGUIR DE ENCONTRO AS ESCOLHA QUE FIZEMOS, POR ISSO TIANA, ENTENDA ESTE TEXTO NÃO COMO LAMENTO OU DESABAFO E SIM COMO UMA ATITUDE DE UM PROFESSOR QUE NÃO SE MECANIZOU DIANTE DE TANTAS INDIFERENÇAS E QUE ACREDITA NA ESCOLHA QUE FEZ E TEM PLENA CONSCIÊNCIA DE SEU PAPEL.COMO PODERÍAMOS EXERCER NOSSA CIDADANIA SEM PERPECTIVAS DE MUDANÇAS? LEMBREMOS DA MÁXIMA FILOSÓFICA DE ATO E POTÊNCIA, TODOS SOMOS UM CONSTANTE VIR A SER. ACREDITAR É NECESSÁRIO, MUITO EMBORA TENHAMOS A CONSCIÊNCIA DE QUE, MAIS QUE NECESSÁRIO É UMA ESCOLHA.FAZER A DIFERENÇA NÃO TEM HAVER COM TROCAR DE PROFISSÃO, MAS ESCOLHER TROCAR DE POSTURA.ENFIM,PARABÉNS PELA SUA ATUAÇÃO PROFESSOR ALDINETO, FICO MUITO FELIZ EM SABER QUE APESAR DAS INSITENTES ” INJEÇÕES” PARA ANESTESIAR OS SERES HÁ PESSOAS QUE NÃO SE PERMITEM ESTE ANESTESIAMNETO.QUANTO A NÓS RESTANOS UMA AUTO CRÍTICA: QUAL É AtuAção????????

  15. PARABÉNS PROFESSOR PELA SABIAS PALAVRAS,INFELIZMENTE AINDA SOMOS VISTOS COMO TAPA BURACOS E SABER QUE NOSSA PROFISSÃO E ESCOLHA É BELÍSSIMA.

Deixe aqui seu comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *